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domingo, 1 de março de 2015

Ensaio sobre a consciência no século XXI



Não, não é ficção. Antes fosse porque teríamos a oportunidade de, a partir da ficção nos pudéssemos prevenir para evitarmos um futuro sombrio, mas antes, muito antes de chegarmos a este ponto, vários autores já escreveram ficções e pelo que parece não nos prevenimos nem um pouco. Funcionaram como incentivos [1]. Se buscarmos na ciência os motivos que nos trouxeram até este século, podemos pensar nos antibióticos que nos prolongaram a vida, o saneamento básico, a imprensa, a eletricidade, a genética, a pílula anticoncepcional, os equipamentos eletrônicos, a televisão, a física quântica, a Internet e muitos outros. Se buscarmos dentro de nós mesmos, o que nos trouxe foi uma enorme vontade de viver, de lutar contra todas as adversidades e, sobretudo, de buscarmos a independência da individualidade de cada um. Mas como convivermos pacatamente com tanta diversidade de cada aspecto de nossa diversidade? Temos além da individualidade que conviver com nacionalidades diferentes, gêneros, religiões, religiões dissidentes, políticas filosofias e governos diferentes. Nesta conjuntura é completamente impossível que algum governo consiga agradar a toda a população. Surgem extremismos. Populações que cresceram mais do que os recursos dentro das fronteiras podem suportar completam o quadro mundial da pressão existencial.

É praticamente impossível esconder uns dos outros o que se passa pelo mundo. A propaganda, por melhor engendrada que seja, não consegue convencer-nos do que querem que entendamos se o que virmos for diferente do que apregoarem. Governos como os de Hitler e Lênin não conseguiriam sobreviver nos dias de hoje, mas exerceriam uma tremenda pressão sobre as populações na tentativa de subsistirem.  No entanto existem governos ainda que, embora por pouco tempo mais, conseguem sobreviver. São países de profunda religiosidade em que a população coopera mantendo-se à margem das descobertas tecnológicas, numa inocência colaborativa que chega a impressionar. No contexto das nações não colaboram com o desenvolvimento nem consomem o que se produz. Colocam-se elas mesmas à margem numa fronteira entre o céu e a terra, com relógios internos que atrasam meio século a cada ano que passa nas demais nações. A própria ignorância de nações onde se vive de forma diferente contribui para essa retração no tempo capaz de desafiar os mais verídicos conceitos da relatividade de Einstein. As nações são constituídas de indivíduos. Quanto mais diversificadas em tudo mais fácil é a convivência embora com problemas de menor monta. Quanto maior o grau de identidade dos indivíduos de uma nação, mais fácil se torna converter um líder em ditador. Estamos assistindo a este fenômeno no recém formado “Estado islâmico” no qual Abu Bakr Al-Baghdadi se fez instalar como chefe supremo. Governa pelo terror usando como ferramenta o Corão do qual extrai apenas as suras que lhe convém. Outras religiões fazem exatamente a mesma coisa, embora de forma menos violenta e extremista.

Se olharmos com mais atenção, ou sob outro ângulo, talvez possamos constatar que o mundo nunca teve tanta profusão de “grupos” com perfil tão específico como nos tempos iniciais deste século. Se desejarmos obter um marco, o mais sugestivo talvez fosse o da “guerra entre os sexos” dos quais se originaram os mais extremistas machistas e feministas. Depois apareceu a “guerra dos gêneros” com base no homofobismo e embora não haja relação alguma aparente, surgiu a Al-Qaeda, o “Occupy Wall Street”, Taliban, Al-Shabaab, o Estado Islâmico, o Boko-Haram, e movimentos novos de independentismo como na Ucrânia, enquanto outros como o IRA e a ETA se extinguiram. Em nível de nações surgiram novamente os caudilhos que se instalam no governo em perfeitas ditaduras. Neste grupo de nações inclui-se a Rússia com Putin que anexou a Criméia e tenta anexar a Ucrânia, Chávez na Venezuela que projetou Maduro antes de sua morte, Lula que projetou Dilma Rousseff no Brasil, Evo Morales na Bolívia e Cristina Kirshner na Argentina, todos estes se perpetuando no governo de suas nações. Há muito a ONU parece fazer vista grossa na fiscalização de eleições porque aparentemente o mal que se pode causar em falsificar eleições ou comprar votos se limita às fronteiras destes países, e quanto pior for a sua economia mais aviltados ficam os preços dos produtos.  A acreditar-se numa teoria da conspiração seria da Banca Internacional com os caudilhos como marionetes usando filosofias de esperança e fé vãs como o comunismo e o socialismo ao extremo. Abstendo-nos de pensar em teorias de conspiração podemos entender o momento atual de formação de grupos de nações e de indivíduos como fruto da liberdade de pensamento e da preocupação maior de manter uma certa identidade dentro das fronteiras, com forte fiscalização, tanto quanto possível, atuando como muros de separação.

As economias parecem correr à margem da política, mas não é verdade. Após a globalização estão intrincadamente interdependentes umas das outras. Os capitais “viajam” até pela net sem nunca saírem do lugar, ou desaparecendo após uma senha e um “Enter” num computador. Banqueiros mundiais podem ser considerados também como um grupo, ainda não terrorista, mas de certa forma fazendo seus estragos nas economias individuais. Os juros bancários no Brasil chegam a 200, 300 por cento ao ano. Companhias e empresas terceirizadas por governos impõem suas próprias leis através de contratos mancomunadamente redigidos com deficiências, pagamento de propinas. Governos, banqueiros e empresas fizeram um casamento a três, proporcionam a perenidade de governantes caudilhos à frente de suas nações. Pode parecer que este texto seja contra o capitalismo, mas não o é em absoluto, mas contra o exagero. O exagero leva ao afrouxamento das leis porque tudo se corrompe. Este afrouxamento se dá primeiro nos mais altos escalões dos governos e ganha as ruas rapidamente. Ao ganhar as ruas gera mais insatisfação e o surgimento de mais grupos extremistas. Uns para roubarem, outros para modificar ou manter a política em seus estados. Além dos cartéis de drogas que surgem pelo mundo, surgem também extremistas como os “black blocks” surgiram no Brasil interferindo em manifestações pacíficas contra o continuísmo de um partido político que arrasa a economia brasileira, o PT, há 13 anos no poder com previsão para mais três.

Áreas de tensão internacionais podem ser notadas no norte de África e África central onde atuam o Estado Islâmico e o Boko-Haram; o Afeganistão e Paquistão  com o Taliban;  Afeganistão Paquistão Quênia Síria Índia e Somália com a Al-Qaeda;  Somália, Quênia e Uganda com a Al-Shabaab; Iraque Líbia e Síria com o Estado Islâmico; Nigéria, Chade, Níger e Camarões com o Boko Haram; Israel e o terrorismo emanado de países árabes limítrofes; uma ilha no mar do Japão em disputa entre China e Japão; um certo tipo de guerra fria entre a China Continental e Taiwan; Guerra civil na Síria; uma latente guerra fria entre Paquistão e Índia pela posse de Cachemira; a Colômbia ainda lida com o problema das FARC; A Chechênia ainda pretende se separar da Rússia.

Em muitos lares neste momento há divergências como nunca houve na história da humanidade; em muitas empresas se luta por postos e posição hierárquica no trabalho; pais e filhos nunca foram tão dependentemente independentes; a ONU nunca foi tão pouco chamada a intervir como nos últimos dez anos; as revistas em aeroportos parecem-se agora mais com revistas de prisioneiros quando são admitidos em prisões; rackers atuando oficialmente para os governos ou por conta própria sabem tudo o que se passa e o que fazemos através de nossos computadores. Pagamos nossa liberdade com o dinheiro de nosso trabalho sem sermos livres. Vivemos em jaulas douradas por propagandas com shows de bandas, programas de televisão, fogos de artifício, mobilização política, que nos desviam a atenção dos escândalos políticos. Podemos perguntar-nos onde anda a nossa consciência política, e se vale a pena tentar mudar alguma coisa. Fernando Pessoa disse que tudo vale a pena se a alma não for pequena. Então deve valer a pena tentar mudar a política, a religião, a economia, mas também se sabe que não são uma ou duas andorinhas que fazem o Verão. Talvez um grupo de andorinhas possa fazê-lo, mas já há tantos grupos que nada mudaram, que mais um não o faria. Verão! Verão que o mundo, a humanidade escolhe seus caminhos sorrateiramente, dia a dia, semana a semana, mês a mês, ano a ano, século a século e que é simultaneamente imprevisível, modernizadora e conservadora, porque há aspectos que jamais mudaram desde sua existência, como a riqueza e a pobreza e o aparecimento de dissidências. Chegamos a pensar que se um dia estes problemas acabassem de vez não teríamos razões importantes para continuarmos a viver. A consciência de cada um tem um alcance muito limitado, mas a soma das consciências da humanidade determinam o seu caminho para o amanhã.

® Rui Rodrigues



[1] “1984” de George Orwell foi um deles. Julio Verne contribuiu com várias publicações. 

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