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sexta-feira, 30 de maio de 2014

Cronicas do Peró - siris,toco e pimenta rosa

Hoje saí para pescar siri, mas só colhi um ramo de pimenta rosa e coletei um toco.



Saí de casa em dia de sol e céu de brigadeiro, e caminhei 150 metros até a borda da areia da praia. Depois mais 500 metros até as pedras do Pontal, e fiz o percurso de volta. Levei meu puçá de cabo para apanhar uns siris. Estava com vontade de fazer um espaguete de siri com queijo ralado e molho de pimenta rosa. Logo na areia da praia me deparei com uma “poluição” saudável: Restos de  algas, pedaços de vegetais empurrados pelas marés, trazidos das ilhas em frente. São bastantes ilhas que compõem a paisagem.  Hoje havia uns dois ou três tarrafeiros tentando pescar umas tainhas ou paratis distraídos. Não tem sido grande a pesca artesanal e de subsistência por aqui porque o barco de arrasto passou antes da páscoa para limpar a área de peixes e tudo o que vem no arrasto. A ultima maré trouxe também um lindo tênis branco solitário da direita, cordões ainda amarrados, um par desencontrado de sandálias tipo hawaianas, uma profusão de tampas plásticas de garrafas pet, pedaços de isopor e de cordas. Marés já trouxeram até coisas bem maiores, como um cadáver de baleia que tresandou a praia por uns bons quinze dias, imobilizado nas pedras. Hoje a água estava morna.



Mas hoje não havia siris. Não vi nenhum. Devem andar assustados como tudo o que vive em Cabo Frio, Rio de Janeiro, Brasil e arredores. Há bastante tempo que não vejo siris por aqui. Há muito tempo mesmo, quase um ano. Nem as conchas, difíceis de coletar, enterradas na areia. Mas a natureza sempre nos compensa, e hoje fui compensado com três coisas: Uma revoada de centenas de andorinhas percorrendo as dunas, um toco para a minha churrasqueira para dar sabor ao churrasco, e um ramo de sementes de aroeira, a famosa pimenta rosa.

A pimenta rosa é coletada de forma extrativista na região. O que mais existe por aqui são aroeiras, mexilhão nas pedras do Pontal, pitangas selvagens, paratis nas ondas e gente que chega em caminhões e ônibus e enchem a praia de sujeira que é recolhida como se pode. Os papagaios passam sem parar a caminho das ilhas para pernoitarem fazendo uma chilreada alegre. Os pica-paus não se misturam com os quero-queros senão o cantar dos filhotes seria meio estranho e misturado.
A coleta permite que empresas revendedoras vendam, a granel, o quilo dos grãos de pimenta rosa entre  49,00  e 100,00 reais. Para um custo de matéria prima igual a zero, por ser uma dádiva da natureza pródiga, é um custo muito alto. Ainda mais quando se sabe que os coletores a vendem aos atravessadores a 1,50 reais o quilo.  Mas quando chega à Europa, por exemplo, é vendida a 4,00 euros, ou 15 reais o sache de 40 gramas. Isto resulta num preço de quilo de 375 reais o quilo. Realmente a economia mundial padece de alguns controles para evitar o excesso de lucros tão gritantes. Algo que custa 1,50 na colheita não deveria ser vendido a 375,00. Isto é uma loucura e impede o largo consumo por economia de escala.

A fábrica de refrigerantes da Shweeps fabrica uma especialidade à base de pimenta rosa, alguns perfumes franceses têm como matéria prima a pimenta rosa, condimentos e até sardinhas são fabricados com pimenta rosa. Quanto ao sabor não há nada comparável. Em lugar algum. O sabor e o cheiro são únicos. Ainda me lembro de meus passeios pelo campo nas fazendas do Rio Grande do Sul, quando me diziam que ao passar perto de uma aroeira a teria que cumprimentar humildemente, dizendo: Bom dia ou boa tarde senhora aroeira, para não sentir alergia que poderia até fechar a garganta. Sou alérgico a muitas coisas, inclusive à incompetência, mas à senhora aroeira, não.



® Rui Rodrigues 

quinta-feira, 15 de maio de 2014

Nosso corpo, nossa vida, nosso mundo, nossos problemas.

Nosso corpo, nossa vida, nosso mundo, nossos problemas.

(Refiro-me sempre a masculino e feminino. Não há diferenças entre os sexos a não ser nas partes mais íntimas e nas curvas – para evitar graficamente os parênteses de (o), (a))


Todos sabemos que o Universo não pára de evoluir e se expandir, que a natureza não para de evoluir. Somos seres nesse mundo de universo e natureza sempre em evolução. Os outros animais não devem ter consciência de sua adaptação à evolução.Eles evoluem sem saber, sem sentirem. Nós, pelo contrário, temos “arquivos” escritos, desenhados, tradições faladas, estudos em geral que nos permitem saber que estamos evoluindo. Para onde, não sabemos, nem as razões, exceto uma: Ou evoluímos como espécie ou perecemos. A maioria dos animais predadores foi ficando pelo caminho da nossa própria evolução. Muitos foram extintos. Entretanto, nosso corpo também evoluiu: De corpos maciços, atarracados, peludos e rudes, estamos evoluindo para um novo tipo de corpo: O corpo belo. Parece que os corpos dotados de maior beleza, baseada esta em simetrias e proporções, terá maiores probabilidades de evoluir e passar seus genes do que corpos menos dotados, exatamente pela preferência de acasalar ou adquirir genes de corpos mais belos. Esta evolução para o “belo” só foi possível porque criamos artefatos que nos permitem ficarmos vivos sem o perigo de sermos devorados por feras na pirâmide alimentar. Hoje estamos no topo dessa pirâmide. Somos os maiores predadores desta natureza que conhecemos. Curiosamente, o fato de preferirmos corpos “belos” para o acasalamento não significa que estejamos escolhendo corpos dotados da melhor ou mais eficiente inteligência, e muito raramente coincide de um corpo belo ser dotado da mais eficiente inteligência. Vivemos de nossas escolhas, colhemos benefícios ou malefícios em função de nossas preferências. Na medida em que envelhecemos, apesar de todos os artifícios para mantermos o corpo o mais jovem possível, vamos percebendo que a evolução nos deixa “para trás” a cada dia, porque nos é difícil acompanhar essa evolução, em todos os aspectos. Operações plásticas custam caro, são ainda perigosas e de sucesso incerto, e com a tendência para a associação de casais de beleza semelhante, parece cada vez mais difícil arranjar companheiros ou companheiras a cada ano que passa. Parece. Apenas parece. Quanto á evolução dos costumes, também nos é difícil acompanhar: Os costumes sofrem a influência da tecnologia e a da informática parece a mais difícil de ser assimilada, não só pela aparente dificuldade de entendimento e manipulação que exige coordenação motora como também pelo preço dos equipamentos de informatizados. Mas ainda existe dificuldade maior de adaptação: Trata-se do aspecto afetivo. E este aspecto envolve não nosso o nosso corpo, como a nossa vida, o nosso mundo, os nossos problemas, mas até que ponto os nossos “problemas” são reais? Se os pudéssemos eliminar, poderíamos ser as pessoas mais felizes do universo, desde que não sejam intrínsecos do nosso mundo, do qual parece depender nossa vida, já que até o corpo tem conserto...


A forma de nosso corpo não tem muita importância. Há sempre uma tampa para cada cesto, na medida certa, para quem tem equilíbrio na vida e não se aventura em oceano brabo navegando numa piroga sem remos e sem salva-vidas. Ainda crianças ouvimos de nossos colegas algumas alusões a nossas deficiências e não raro aludimos também às deficiências dos outros. Isso é “buling”, claro, e deixa muitas vezes marcas amargas. Ou achamos que temos a bunda grande, ou a perna grossa, ou o nariz torto para um lado... E quando adultos, realizamos o sonho de infância indo corrigir numa mesa de operações, as “deficiências” com as quais nunca aprendemos a lidar. Não são deficiências. São virtudes, porque para alguma coisa servem. Nossos padrões de beleza é que são, como dito acima, muito exigentes num mundo competitivo... E, principalmente, costumamos querer competir em campos para os quais não somos muito aptos. Casar com o príncipe é muito difícil porque ele é apenas um e as candidatas são um montão...


Nossa vida rege-se assim, e muitas vezes ou quase sempre, em função de nosso corpo, de nossas aptidões, de nossa ambição e de nosso equilíbrio. Principalmente rege-se por atos sucessivos, diários, de convivência com grupos que nos cercam. Alguns deles nos dão força, outros no-la tiram, essa postura de enfrentar o mundo. Nosso equilíbrio é determinante para o sucesso a cada dia que passa. Somos um espelho do mundo no qual nos refletimos. Darmos valor ao belo nos dias de hoje, é uma demonstração de prazer. Batemos palmas para o belo. Mas o que exatamente o belo nos proporciona na vida, além dessa oca, vazia apreciação? Parece que nada. O belo não constrói um mundo melhor. Constrói apenas um mundo mais belo. O belo na política é uma desgraça. Apresenta-se um candidato que fala “belo”, que aparenta ser “belo”, e seus votos estão garantidos para nos tornarem a vida amarga. Os nenéns são belos, todos eles, por que é uma defesa da natureza para a preservação da vida. Nenéns são simpáticos, alegres, dão lindas risadas, não franzem o cenho, não xingam, são doces, têm a cabeça grande, os olhos enormes. Cativam. Teríamos um mundo muito diferente se os nenéns fossem feios. E eles têm uma “virtude” adicional: Sempre pensamos que podemos moldar essas crianças para que sejam como “nós” gostaríamos que fossem. É um engano, uma loteria, mas isso só se percebe quando se inserem no mundo que os cerca, que é diferente do nosso, logo que têm essa percepção e começam a pensar por si mesmos. Isso acontece diariamente, de forma muito lenta, mas é por volta dos 3 anos, dos 7, dos nove, dos 12 e dos 16 que notamos “em saltos” como a personalidade de cada criança evolui. Uma dessas crianças é você, leitor, leitora... Talvez não se dê conta disso, mas já tentou sem sucesso agradar a seus “instrutores” da vida, seus pais, familiares e professores, e certamente já teve suas crianças que tentou “educar” a seu modo. É mais do que evidente que você conseguiu ser diferente deles, assim como também é evidente que não conseguiu que seus filhos fossem iguais a você. É uma luta inglória. Ao tentarmos influir estamos apenas atrasando, retardando, a evolução da humanidade. A pressão do meio, da vida, do mundo, não é suficiente para parar a evolução do “eu” jovem, do eu puro de cada criança que consegue atingir a idade dos 16 anos... A partir daí, fará cada vez menos pressão para tornar seus filhos iguais.


Talvez agora possamos entender que nossos “problemas” residem todos eles na forma como entendemos o mundo, dando-nos a impressão que precisamos evoluir como as crianças e com as crianças. Por isso os avós são, geralmente, mais complacentes e cooperativos com elas, mais do que os pais. No fundo entendem um pouco mais, muito pouco mesmo, sobre essa característica dos nenéns: Querem evoluir, mas não os deixam... E crescem cheios de problemas, porque há enormes diferenças entre o mundo que vão desvendando e o mundo que os “instrutores” lhes dizem para viverem. Partidos políticos e “governantes” são assim mesmo: Ditadores que tentam impor a sua vontade por incapacidade de entenderem, ambição de poder mandar, aproveitadores dos benefícios das contribuições de impostos, vaidade frente ao “resto”, despreparo para as novas gerações, para o mundo sempre em mutação.

Será que o mundo agora ficou mais fácil de entender e poderá ser menos problemático? Espero que sim... Francamente! Não deixe morrer a criança que você já foi... Seja feliz, deixe o mundo seguir seu rumo, porque seja o que for que possa fazer, não o mudará nem um milímetro...


® Rui Rodrigues

sexta-feira, 9 de maio de 2014

A bolha imobiliária brasileira - 2014

A bolha imobiliária brasileira - 2014



Vivemos na ilusão de que “um dia seremos ricos” e para isso há que poupar e trabalhar duro. Não é bem assim. Claro que se não pouparmos e não trabalharmos duro jamais seremos ricos, mas a inversa não é verdadeira. São necessários muitos outros atributos e cuidados para que possamos um dia vir a sermos ricos. Muitos de nós não o somos por que não estamos dispostos a arriscar, a seguir por caminhos menos ortodoxos, ou não temos visão para os negócios. Quando chamamos sócios, ou arrebentamos com eles ou eles arrebentam conosco mais dia menos dia: Não há “amizades” nos negócios. O que há são conveniências temporárias. Nem mesmo entre pais e filhos (único caso de saudáveis exceções), e entre familiares é quase impossível a completa honestidade de princípios. Formei-me em engenharia por vários motivos: É uma ciência fascinante, exige conhecimentos da maior complexidade multidisciplinar, e aplicar em imóveis sempre foi o tipo de negócio mais seguro do planeta. Engenheiro, dono de uma empresa de engenharia, seria como sopa no mel, ainda mais que na Universidade passamos três longos anos estudando economia, calculo vetorial, resistência dos materiais, construímos e mandamos foguetes para o Espaço. Apesar de engenheiro bem sucedido, nunca montei minha empresa de engenharia, não fiquei nem rico nem pobre. O equilíbrio na vida nos traz felicidades que o exagero na sovinice, na ambição, na alta competição não trazem, e passar a vida toda juntando bens para acabar morto como todo mundo sem levar nada para o além, realmente não fez a minha cabeça. Pude assim dar mais atenção à minha família. Não dei a atenção ideal, mas fiz o melhor que me foi possível sem jamais ter deixado cair a peteca.

Mas o que isto tem a haver com a bolha brasileira - 2014?


O que tem a haver é que as bolhas imobiliárias são perigosas, estamos numa delas, e se não houver equilíbrio em você e em todos os setores da economia – porque tudo é interdependente – pode perder o que já pensou que havia ganhado, ou perder tudo o que investiu. Nossa bolha é fruto de vários fatores: Uma inflação proveniente quase que exclusivamente da ambição dos banqueiros com seus juros altíssimos insuflados por um ministério da Economia compromissado com esses banqueiros, e por uma falta de confiança no governo. Todo mundo aumenta os preços, e portanto os lucros, em função da oportunidade da “copa do mundo” e dos turistas que vêm gastar suas economias, e principalmente para garantia de manter uma boa reserva de fundos para os tempos “pós- estouro de bolha”, quando a economia, se não colapsar, ficará tão frágil que qualquer boato adicional a derruba.

Fruto desta ambição, deste oportunismo, desta falta de confiança no governo, os preços dos imóveis aumentaram desde 2008 cerca de 136 % acima do aumento da renda média, no Rio de Janeiro, cerca de 158%. No total, e respectivamente, os imóveis aumentaram 158% em S. Paulo e 203% no Rio de Janeiro. Mas o que esperar do mercado? Que continue subindo? Para quem comprou seu primeiro imóvel “à vista” neste período se deu bem. Quem comprou a prestações tem que rezar para não perder o emprego. Atrasos nos pagamentos implicam em juros altíssimos, os maiores deste planeta. Países como Japão cobram zero de juros para impulsionar o consumo, em outros países os juros são também muito baixos pelo mesmo motivo. Aqui no Brasil os juros beiram a extorsão, a usura. No Japão dos anos 80, a bolha estourou por lá quando o aumento chegou a 168% acima da inflação (num período de seis anos). A dos EUA quando chegou em 2008 a 140% (nos últimos seis anos).



Quando nossa bolha estourar, teremos um caos dos piores da nossa história, porque os demais países do mundo, os mais evoluídos e fortes economicamente, ainda não saíram da crise de 2008 e não compram nossos produtos nos volumes que compravam antes da crise de 2008, ou pelos menos não aumentaram esses volumes de compra na proporção suficiente para nos proporcionar uma balança comercial mais equilibrada. Nossa população continua crescendo. Quem comprou o segundo ou outros imóveis, terá problemas de liquidez se a bolha estourar. Quem comprará de volta esses imóveis se precisar vendê-los e a que preço? Algo que a maioria dos investidores novatos não entendem é essa gangorra da economia: Ações e imóveis sobem astronomicamente ao longo de um período maior ou menor de tempo, e como parece lógico, de repente param de subir. Então, o mercado se torna vendedor em vez de comprador. Os preços caem. Caem tanto, que quem tiver reservas podem comprar de quem precisa por preços aviltados, e em certos casos, quase de graça. Os ricos ficam então mais ricos, os remediados mais pobres, os pobres mais miseráveis, os miseráveis morrem em maior proporção. É a velha teoria da “escada do investidor” : Tenha sempre uma reserva financeira de extrema liquidez, comprando sempre quando os preços estão quase na base da escada, vendendo a partir do momento em que chegarem á metade da escada. Nunca espere os preços chegarem ao topo da escada, porque nunca sabemos onde fica o “topo”, e o topo já está perto do estouro da bolha.

A Europa e os EUA já passaram pela turbulência do estouro das bolhas em 2008. Nós estamos atrasados até no tempo. Não se trata de milagre brasileiro. As bolhas vão estourar e ao que tudo indica, nos meses finais de 2014, inícios de 2015. A desastrosa política econômica do PT, misturando economia com política, não conseguiu frear a inflação. Oficialmente, o governo diz que é baixa, mas quer a bolha imobiliária, quer a manutenção dos altos juros, quer a redução do poder aquisitivo dos salários mostram que anda na casa dos dois dígitos.  Quando após as eleições as concessionárias de serviços públicos aumentarem seus preços e o governo tiver que aumentar impostos para manter seus “programas” eleitoreiros de governo, então as bolhas estouram. Estouram muito feio...



Preparem suas malas e reservem passagens de avião. Mantenham seus passaportes em dia, reze para que não venham com uma lei de retenção de capital, impedindo investimentos no exterior... Invista em ouro, pedras preciosas. Taxas de câmbio não são seguras para guardar dólares ou euros. Governos autoritários costumam estabelecer taxas de paridade fictícias, como na Argentina e em Cuba. Isso não salva a economia, como todos nós sabemos. Nem adianta a pressão dos políticos do PT sobre o IBGE e outros órgãos para tentar distorcer a realidade. Tudo vai mal, e quando estourar, porque a inflação está represada, será como o nascimento de um novo universo. Um universo sem PT com muitos fogos de artifício...



® Rui Rodrigues 

sábado, 3 de maio de 2014

Á morte com carinho!

Á morte com carinho!



Não se assustem... A vida é assim mesmo, desde que em minha adolescência assisti ao filme “Ao mestre com carinho”[1]. Aquele filme lançado nos dias de hoje, da mesma forma, mesmo com figurino diferente, não teria, creio eu embora não seja um pessimista por natureza, o mesmo sucesso. Os tempos mudaram muito no Brasil e não parece que tenha sido para melhor. Mas não falemos de política. Falemos da alegria de viver e do equilíbrio na postura que nos faz sentir felizes apesar de algumas dificuldades, pequenas e grandes, que temos a ousadia de enfrentar nesta epopéia pessoal, de cada um, em Viver!... Viver desde que se nasce até que se morre, pondo-se fim a uma etapa de um ser que não é único, que deve tudo o que foi à diversidade das espécies deste planeta e à diversidade entre todos os seres aos quais chamamos, muito libertina e inconseqüentemente, de seres humanos. Nem todos somos humanos.

Sou um cara feliz, sim. Conto minha vida não pelos momentos felizes, mas pelos infelizes, que foram na realidade muito poucos. Minha felicidade vem sempre da constatação de que meus momentos infelizes foram sempre muito poucos. Sabem porquê? Porque mesmo nos momentos infelizes, eu sonhava com a solução para acabar com essa infelicidade e encontrada a solução, era fazer o “gol” e partir para o abraço. É a teoria do “desprendimento”, livrar-nos de tudo o que nos causa infelicidade. Arrisco até em dizer que Jesus, um grande perceptivo, percebeu essa faceta da “racionalidade” humana: Se a posse de bens te mal faz, larga-os e vem ser feliz. Daí a perceber que a vida é um “bem” altamente perecível, embora sem data de validade, foi um passo só, estricto, direto, valendo para todos os "bens". A vida é como é, o que é, nascemos jovens e morremos idosos porque a força da gravidade e o ambiente em que vivemos nos causam rugas, deformam o corpo. Ter uma cabeça jovem dentro de um corpo idoso não é virtude. É problema, um grave sintoma de inadaptação que gera infelicidade. O equilíbrio é a solução para a felicidade, não necessariamente para a longevidade. Essa nem importa. É necessário que percebamos que logo após a morte este mundo acabou com todas as suas virtudes, lembranças e vicissitudes. É como um desligar de energia em que a lâmpada se apaga. Pergunte a uma lâmpada apagada se (ela) se lembra dos momentos em que permaneceu acesa... Não obterá resposta. A você morto ou morta, poderão lhe fazer todas as perguntas tal como a uma lâmpada apagada que não obterão resposta porque suas condições vitais acabaram para todo o sempre. Se tivesse lembranças após a morte, sofreria por se lembrar das infelicidades e por se lembrar das felicidades perdidas, e isso não seria justo para qualquer deus.
  
Há, portanto, que incluir a velhice e a morte no nosso cardápio de felicidades. Não das felicidades que nos dão prazer, mas daquelas que não fedem nem cheiram, que não têm mais importância do que um par de meias que saiu de moda ou ficaram velhas e jogamos no lixo. Sobretudo, devemos ter um carinho muito especial pela velhice e pela morte. Através da velhice nos preparamos para a morte. Vamos aceitando as “perdas” pelo corpo, pelos bens, pela vida. Quanto mais demorarmos a perceber isto, mais difícil nos fica atingir o equilíbrio necessário e entendermos definitivamente que viver é bom enquanto dure, e que o “tempo” que durar não é o mais importante, mas como estaremos preparados para enfrentarmos as dificuldades sem perder o nosso estado de “felicidade”. Afinal, o mais importante desta vida enquanto vivemos, é o estado de felicidade. E por mais paradoxal que possa parecer, até podemos ser felizes na hora da morte se a entendermos como uma parte dos atos “involuntários” da vida.

E, afinal, mas não finalmente, pense que até os deuses morrem: Odin, Zeus, Marte, Poseidon, Osíris, Ptah, Jesus Cristo (morreu na cruz e não foi de mentira), Ahura Mazda, Ba’aL, Hermes, Euro, Nereu, Neptuno e um Panteão imenso cheio de milhares, talvez milhões de deuses mortos. Eles morrem. Porque nós não?
Viva feliz nesta vida criando para os outros - e para você mesmo (a) - o mínimo de infelicidade possível. Só a infelicidade alheia por frustrações em nos tornarem infelizes pode ser motivo de nossa felicidade. A morte não é bem vinda, mas sua chegada é sempre e felizmente aceitável com um sorriso de felicidade e de boas vindas: Em maior ou menor grau, é o sinal de “dever cumprido” da vida, sem medalhas de heroísmos, sem lugares privilegiados ou gordas contas bancárias no além. 



O tribunal de Osíris está tão morto quando o próprio Osíris, e “corações” não se medem em peso de penas. O que se mede em peso de penas, no sentido mais abrangente do significado da palavra “pena”, é o retorno da felicidade que transmitimos aos que nos cercam e aos que encontramos no caminho de nossa própria vida. Na real consciência, sem mentiras!


Enfrente a velhice e a morte com carinho, venha quando e como vier, para que ela não lhe estrague seus momentos de felicidade. Você vence sempre enquanto viver, e que o viver dure quanto durar!

® Rui Rodrigues

quinta-feira, 1 de maio de 2014

As minhas três mulheres

As minhas três mulheres

Sexta feira à noite no bar, já passando da meia-noite. O barulho agradável e acolhedor da vozearia dos clientes, do tilintar dos copos, do odor dos salgadinhos que passavam perto das mesas, os cartazes de filmes afixados nas paredes chamando a atenção, dando um toque especial ao ambiente. Prateleiras com garrafas antigas, copos antigos, e uma tela de TV enorme, das mais modernas, para os dias de jogos interessantes de futebol internacional. Jogos nacionais só na competição principal entre times de vários estados, conhecido como o Brasileirão.  Jogos entre times da cidade sempre acabam por provocar discussões, brigas... A TV fica desligada. Bem ao lado dela, o aviso!
Naquele dia de fim de primavera caia uma chuva fina, até agradável. As ruas molhadas dão uma impressão de lavadas. Em alguns lugares do centro da cidade, onde fica o bar, pensamos até estar em Montmartre na Paris dos anos 60, principalmente perto do museu de belas artes, do teatro Municipal, nas ruas da Lapa.



A bela mulher chamou a atenção dos freqüentadores do bar do chopp grátis que administro. De vez em quando até sou garçom, barman, caixa, cozinheiro. Depende de quem acho merecer minhas atenções, e fico em particular impressionado como nossos sentidos, todos eles reunidos, podem construir uma imagem, uma definição em tão breves instantes que duram muito menos do que um segundo. Um segundo no tempo que só percebemos quando todos os nossos sentidos estão atentos. Peça a alguém que não tenha praticado handebol, que conte três segundos o mais exatamente possível, e constatará, olhando o relógio, que todos erram para mais ou para menos dependendo de seu estado de ansiedade e atenção. Eles não sabem que para contar os três segundos basta dizer mentalmente e sem presa alguma, da forma mais natural: “Trinta e um, trinta e dois e trinta e três”... No entanto, somos capazes de perceber micronésimos de segundo ao olhar para uma mulher se lhe somos simpáticos, indiferentes, ou até, e de certa forma em maior ou menor grau, repulsivos. Quando ela entrou, percebi-lhe o olhar. Eu iría jurar que veio para me ver, já que não se deteve sobre os demais freqüentadores. Parecia um olhar com endereço certo, determinado, mesmo antes de entrar. Juraria que me procurava. Mentalmente, revendo meus arquivos, não encontrei algum indício de que a conhecera em algum outro lugar. Certamente me lembraria, mas é daquelas mulheres que depois do primeiro contato visual, passa a fazer parte dos “conhecidos” que polvilham nossa vida. Dirigi-me a ela e indiquei-lhe uma mesa perto da janela que sempre tenho reservada para casos especiais. Perguntei se estava sozinha, e deixei-lhe o cardápio com um sorriso que foi correspondido. Discretamente, afastei-me sem perder o contato. Quando ela levantou os olhos procurando-me, eu já estava a caminho. Pediu-me um chope, e um pratinho de mini-quibes [1]. Perguntei se queria molho de limão ou de pimenta. Preferiu o de limão. Escolheu bem. No bar esprememos o limão na hora. Depois me afastei e a admirei de longe.
Era uma mulher de pele morena de traços europeus, lábios ligeiramente grossos, sensuais, com mais ou menos um metro e setenta de altura, cabelos bastos penteados à moda afro. Um batom cor de rosa suave, os olhos límpidos, peito generoso que cabe na mão, cintura marcada, curvas perfeitas com pernas perfeitas, os pés com dedos bem torneados. O vestido era de flores, em tons violeta, de seda, brincos discretos, um colar que lembrava esmeraldas intercaladas com lápis-lazúli, e seu andar era firme, equilibrado, discreto sem chamar a atenção. Os sapatos, fechados, eram azul noite. Perfume Chanel numero cinco, que jamais sai de moda. Uma deusa! E a voz, clara, dicção sem vícios ou trejeitos. Mas era o olhar que me matava. Os olhos eram verdes!


A primeira fase da atração tinha me vencido. Aquela era a mulher que eu via, que eu sentia, minha cabeça se perdia em devaneios acompanhado de sua imagem. Era isso. A primeira das mulheres que vemos numa mulher, é sempre a imagem que construímos com nossos sentidos mais urgentes e imediatos. A imagem gera atração, desejo, aproximação. E neste devaneio, nossos olhares se cruzaram uma, duas vezes. Então me aproximei. Perguntei-lhe se o chope estava como desejava e se os quibes estavam a contento. Ela elogiou os quibes e o molho de limão. Pediu mais um chope e perguntou se lhe poderia dar a receita. Foi então que notei a sua pele. Era sedosa salpicada de discretos pelinhos cor de ouro, sem mácula. Não tinha mais que trinta anos. Talvez uns 27. Um universo com mãos do tipo que afagam mais do que trabalham no pesado! E não... Não era prostituta certamente. Perguntei se podia fazer-lhe companhia. Fez-me sinal para me sentar, e lhe expliquei como fazia os quibes. Foi então que surgiu, despontou, desabrochou a segunda mulher que habitava nela, um pouco ansiosa, como criança que se depara com um prato desprotegido de “brigadeiros”. Era casada há já alguns anos, uma meia dúzia. Seu marido estava viajando e ficaria fora por uma semana. Só voltaria na próxima segunda feira. Ela o amava e respeitava muito e sua relação não era aberta. Acreditava que seu marido não a traía, ou se o fazia era de tal modo discreto que não se percebia. Não queria em hipótese alguma terminar a relação. Pelo contrário, pretendia fortalecê-la, mas, como ela mesma explicou, precisava urgentemente de uma relação temporária diferente. Algo como uma aventura quente, sem compromisso, onde pudesse dar vazão a todas as suas fantasias.
Se a primeira mulher que conhecemos pela imagem de nossos sentidos nos desperta emoções, a segunda mulher que descobrimos por debaixo da capa da primeira, é sempre mais excitante se corresponde ao “sonho sensual” a que nos dedicamos a partir da primeira sensação. É como mel no pão, queijo com goiabada, torradas barradas com manteiga e café com leite. Só falta comer.


Fomos para minha casa. Convidei-a para tomar “qualquer coisa”, mas nada se preparou porque nos beijamos. E beijamos, mãos ávidas percorrendo os corpos. Levantei-lhe a saia levemente e senti-lhe a pele morna das coxas enquanto ela me despia a camisa. Convidou-me para tomar uma ducha, uma ducha também morna, a água escorrendo pelos olhos que tinha que manter fechados quando lhe tentava olhar o rosto em êxtase, abertos quando lhe olhava o corpo esbelto, sensual, firme, sem pêlos púbios. Meus 37 anos se abaixaram para beijar aquele monumento, meus dedos acariciaram-na, minha língua lhe deu o prazer entre suas pernas trêmulas. Não há quem dê sem esperar receber, e sua boca foi mais do que generosa, sua garganta em ânsias, espasmos, sua língua percorrendo tudo o que mais desejava dentro de si. Assim passamos o resto da noite até o sol nascer, alternando posições, penetrações, num corpo que já não tinha segredos. Um corpo desvendado e gozado em toda a sua amplitude, o meu oferecendo-lhe o mesmo gozo.


Acordei pelo meio dia sem conhecer a terceira mulher que existia dentro da segunda, esta coberta pela capa da primeira. Encontramo-nos mais uma vez, nessa mesma noite. Larguei o trabalho quando eram apenas oito da noite. Recebi-a em casa com um bom vinho, um jantar simples, mas preparado com todo o cuidado e o melhor do meu bom gosto. Nada para impressionar, apenas para saborear, dar prazer. Então, logo na primeira vez que nos amamos, ela me disse para ficar quieto com o membro dentro dela. E começou a apertá-lo em suaves contrações. Quem estaria disposto a abandonar uma mulher daquelas? Como seria possível que o amor, o desejo acabassem algum dia? E como me poderia abandonar, se lhe dava o que queria, o que desejava? Mas quando acordei pelas dez da manhã, ela não estava no meu apartamento. Deixou um bilhete: “Te agradeço todo o prazer que me deste. Gostei tanto que temo, que com mais outro encontro largaria tudo para trás e só pensaria em ti, mas a vida é complicada. Assim, mesmo sofrendo pela ausência futura, sinto que não posso mais te ver. Beijos e desejos eternos da eternamente tua”. E assinou com um “Eu”.


Nunca soube seu nome, onde vivia, onde morava, quem era o marido.  Um dia, cerca de dois anos depois, olhando os jornais, vi sua foto e li a notícia de que se tinham separado. Só então fiquei sabendo quem era. Tarde demais. A terceira mulher era simplesmente uma mulher com alma, como qualquer mulher ou homem, buscando a felicidade do momento. Então me lembrei de um dito feminista, que dizia para o marido “muito ocupado”: “aqui em casa só há uma regra: Transa-se todos os dias, a qualquer hora, seja com quem for”.

O terceiro homem que existia em mim, por aquela época – afinal todos somos iguais nisso, homens e mulheres – não estava disposto a dividir a terceira mulher que nela existia, e isso era pedir-lhe demais. Esperei, no entanto, que ela aparecesse lá pelo bar algum dia... Mas o tempo a engoliu por completo e me engoliu a sua lembrança. Não a perdi para o tempo, mas para a vida. Lembrei-me dela hoje, por essas coisas da vida que de repente se abrem em nossa caixa de pandora, o cérebro, a imaginação... Jamais um inventário. Nunca fui colecionador. Homens e mulheres devem ser "descascados" camada por camada, até que apareçam, despontem, todos os "perfis" de cada um. E ou aceitamos ou rejeitamos, a qualquer momento, por boas ou deficientes razões. Mas, se forçamos a convivência, seja por que motivo for, mesmo não querendo aceitar algum desses perfis, melhor procurar na Zona a aceitação geral e irrestrita sem questionamentos. Basta pagar uns trocados que não fedem nem cheiram. Proibir o meretrício é solapar a individualidade de cada um, a liberdade de se ser o que se quer ser de forma remunerada ou por simples prazer. 

Do mais fundo de minhas boas lembranças, as moças das fotos são apenas semelhanças. Jamais publicaria a foto verdadeira. 
® Rui Rodrigues
    
   







[1] Receita de mini quibes: Rende: 50  mini quibes, aproximadamente

Ingredientes

1/2 kg de trigo para quibe, 750 ml de água, 1/2 kg de carne moída, 3 dentes de alho picados, 1 colher (sopa) de hortelã picada, Sal a gosto, Óleo para fritar

Modo de preparo

Preparo: 20 mins  ›  Tempo adicional: 1hora de molho  ›  Pronto em: 1hora20mins 

1.                      Deixe o trigo de molho na água por cerca de 1 hora, ou até que tenha absorvido toda a água.
2.                      Doure a carne moída com o alho e o sal numa frigideira. Junte com o trigo e adicione a hortelã e mais sal, se desejado.
3.                      Enrole quibes pequenos e frite numa panela com óleo bem quente. Sirva a seguir.