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segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Está lá o corpo estendido no chão





Dia de jogo de futebol. Emoções à flor da pele, esperando o momento de gritar “gol” e exorcizar todos os demônios que infernizaram a vida de cada torcedor durante a semana. Alguns escutaram gozações por que seu time está mal no campeonato, outros que o time está bem mas nunca chega “lá” no topo da tabela. Outros ainda querem “vingança” do patrão ou do chefe, que é do time contrário. A adrenalina foi aumentando no sangue desde segunda feira e sábado seria o grande dia de explodi-la em vários gritos de “gol”,quantos mais melhor para que depois o espírito se acalme.

Na sexta-feira combinou-se o local de encontro das torcidas, quem iria e quem não iria. Economizaram-se chamadas telefônicas, até importantes, para que pudesse haver saldo suficiente para combinar os detalhes da ida ao estádio, item por item. Não esqueceram lenços com pedras dentro para girar e arremessar contra os “inimigos” do time adversário. Como todos os anos matam torcedores mais afoitos e “irritantes” pensam que devem estar sempre preparados para a revanche. O povo esquece, mas as torcidas “organizadas” não. Outros mais fracos levaram facas e revólveres. Antes de sair de casa, um banho, perfume, camisa do time, umas cervejas para não gastar no estádio, e alguns provavelmente cheiraram, fumaram até ficarem no “ponto”. Do estudo sobre o comportamento humano sabemos que o indivíduo pensa “diferente” quando está em grupo. Costuma haver “comunhão” de sentimentos para não ser diferenciado, descriminado, afastado do grupo. Assim, quando começa uma discussão, uns alimentam o ódio dos outros, e quem o não tinha, passou a tê-lo e odeiam sem se preocuparem se é ou não necessário ou correto odiar.

Em futebol não interessa justiça. Todos viram que foi pênalti contra o seu time, mas encontram sempre uma desculpa para negar e quando nem desculpa encontram, dizem que é assim mesmo, o futebol. Gostam quando o seu time é beneficiado e odeiam o árbitro, o sistema, o trabalho, a família, os amigos de outros times e até do seu, quando discordam e mostram a verdade. Futebol é paixão e os órgãos que superintendem esse esporte não fazem nada para que as arbitragens sejam mais justas, mesmo com tantos aparatos disponíveis da tecnologia moderna. Deve ser herança da romanização européia, quando para governar se usava a máxima do “pão e circo”, sendo o circo romano o lugar onde se matavam animais de montão, e onde os gladiadores se matavam uns aos outros. Quando as apostas eram muito altas em função da força e astúcia de um gladiador, quem estava a par das “injustiças” apostava no mais fraco. Pela noite davam ao mais fraco uma beberagem que o deixava fraco. Os apostadores desonestos ganhavam seu farto dinheiro, o gladiador morria no circo mas havia muitos mais esperando a sua vez. No futebol é assim mesmo. Clubes não fazem os exames necessários, e os casos de morte súbita estão nos jornais. Nem todos são publicados.  

Num recente enfrentamento de torcidas em S. Paulo, um policial afirmou que viu as duas torcidas se enfrentando mas que não pode fazer nada porque as torcidas eram muito grandes e a força policial pequena. O governo não tem estratégias para deslocar as forças necessárias em dias de jogos, ou não tem os efetivos necessários, ou também não se importa.  A FIFA pretende que se libere a venda de cervejas nos estádios durante o mundial de 2014, mesmo sabendo o que o álcool misturado com paixões pode provocar. O negócio da FIFA é dinheiro na base do pão e circo. Se houvesse lei permissiva, talvez até baixasse o dedo no final das partidas para matar o goleiro que errou e promover a cônsul o artilheiro que fez mais de três gols no time adversário. Não se pode esquecer o mal súbito do Ronaldo, fenômeno, numa final de copa do mundo.

E as torcidas do Vasco e do Flamengo se encontraram. Foram preparadas para o confronto. O Flamengo em ascensão, o Vasco a ponto de garantir o primeiro lugar na tabela.

Ficou lá o corpo no chão, estrebuchando, baleado e esfaqueado. Morreu.

A FIFA poderá alegar que não tem nada com isso, o governo do Estado e da nação idem, as forças policiais também, e fica por isso mesmo, sabendo nós que a triste história voltará a ocorrer muitas e muitas vezes. Normalmente as discussões têm por base as “injustiças” cometidas em campo durante o jogo e devidas também normalmente, pela arbitragem.

Acabar com o futebol? Não! Jamais!

Mas precisamos mudar as suas regras usando mecanismos que o tornem justo, educar melhor as nossas crianças desde pequenas em casa e nas instituições de ensino, usar as verbas públicas onde são mais necessárias e sobretudo na educação, na saúde e na segurança e fazer com que as CPIS nos dêem a garantia de que criminosos vão para a cadeia e não tiram vantagem dos mais fracos. Os mais fracos são 200 milhões de brasileiros que não podem nem votar onde as verbas arrecadadas com os impostos devem ser aplicadas.

Está lá o corpo estendido no chão, agora com sete palmos de terra por cima, uma vida perdida. Na foto um torcedor do CRB.

Rui Rodrigues

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