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sexta-feira, 24 de março de 2017

Meditando sobre a vida.


Gotas de chuva batem nos vidros da janela, goteiras despencam do telhado na área de serviço. A água está numa caneca ao fogo, esperando a hora certa para se misturar ao pó de café que aguarda pacientemente no coador de pano. A TV está desligada. Paira no ar um sentimento de tranquilidade que o ambiente físico ao redor atesta. Se desligar o ventilador, e a luz, sentirei uma paz que poderia ser eterna. Mas é muito cedo para essa paz, e bastante cedo para ir para a cama. Ando pintando uma tela nova. Estou na fase de desenho e ainda me vai levar algum tempo. O mar deve estar muito tranquilo, porque não escuto o som de uma onda sequer, coisa que se escuta a toda hora normalmente. Não vou pintar. Liza me chama para dormir, mas passamos a tarde na cama. Os escritos podem esperar. Liza não pode esperar. Mas este escrito não pode esperar por causa de uma foto. Perdão, por causa de duas fotos. Liza entende porque lhe mostro o motivo. Na primeira, num único momento, num único instante, três meninas mais ou menos da mesma idade, envolvem-se na mesma coisa, mas têm três reações bem diferentes, assim como os três macaquinhos um que não ouve, outro que não fala, outro que não vê. Há um mundo de perguntas que se podem fazer, mas que talvez não valham a pena. Mas nenhuma das três vê a mesma coisa, assim como num mundo qualquer e neste em que vivemos, ninguém vê o que o outro vê. Parecido, talvez! Na outra foto, a diferença entre o conforto da vida e o conforto da morte. Os ossos que parecem nada dizer, disseram que eram chineses. Vinte e oito chineses. Morreram na Coréia do Sul durante o conflito em 1950-1953, que separou as duas Coreias, com intervenção de forças armadas chinesas e americanas. Os ossos serão devolvidos para enterro definitivo pelas famílias. Naqueles tempos, soldados eram mandados sem se perguntar se queriam ou não participar em guerras fora do seu pais. Hoje não morreriam aqueles. Talvez outros. Certamente outros. Naqueles tempos a ideologia era outra. Também não morreriam por defender ideologias, porque hoje não haveria guerra por motivos simplesmente ideológicos. Esses 28 soldados deram "azar" de viver num momento sem importância alguma para os dias de hoje, entrando num conflito que não era deles, defendendo "posições" que hoje não nos dizem nada. A família deles já aprendeu a viver sem eles. O resto do mundo os desconhece. Se fossem vivos e soubessem que morreram por nada, sentir-se-iam muito frustrados. O rio do tempo os levou para sempre. Se os convidassem a voltar talvez dissessem não pela primeira vez em suas vidas.

Vou tomar um saboroso café. As duas moças estão muito confortáveis analisando crânios, fêmures, tíbias, falanges e falangetas. Os vivos quase sempre estão confortáveis e bem. Crânios queimados deve ter sido por causa de Napalm. Ontem morreu gente na ponte de Westminster. Londres. Mais um atentado sem pés nem rabo nem cabeça, inqualificável, sem mérito ou necessidade. O mundo desperdiça a vida sempre por não entender o que ela significa nem o que se pode fazer com ela.

Volgograd, Russia. Animal tamer Pavel Kudrya with one of the two bears he has been keeping at his home since their show was cut from the Russian State Circus Company
Viva e deixe viver! Ensine pessoas a viver. Nem que seja um velho e um pobre e isolado urso para quem o circo já acabou na Russia.

Rui Rodrigues

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