Os últimos condenados à morte
Aqui, pelo ocidente, dividimo-nos entre os que vêm na pena de morte virtudes de justiça, e os que acham que não se deve matar o semelhante em nenhuma hipótese. Não se questiona essa divergência neste artigo.
Mesmo para os adeptos da aplicação da pena de morte, aqui pelo ocidente, há os que a defendem incondicionalmente, e os que se preocupam com a eficiência da lei, lamentando seus erros e questionando-se, no íntimo, se vale a pena correr o risco de condenar à morte possíveis inocentes. E não são raros estes.
Há, aparentemente, a necessidade de que as leis sejam aprovadas – pelo menos algumas delas – pelo voto popular, face à disparidade mundial dos conceitos que norteiam a elaboração dessas leis. Vida não tem bandeira nem pode ser refém de idiossincrasias. Parece-nos que, onde há lei para pena de morte, se devesse restringir a elementos que já assassinaram mais de uma vez, a sangue frio, não em defesa própria, de forma premeditada e que não sejam deficientes mentais. Porém nota-se que a aplicação se estende a “inimigos do estado”, dissidentes, fugitivos, a gente inocente que nunca matou e foge para não morrer.
O Título “Últimos condenados à morte” refere-se aos últimos porque a pena de morte já foi abolida, e aos últimos de uma longa série que ainda não terminou. Os cidadãos precisam saber da força que têm sobre o Estado que os governa. Deveria ser o contrário: O povo governando o Estado, dizendo-lhe o que quer, como quer, quando quer. Quem governa deveria servir o povo.
Na forma como os governos decidem tudo, penas de morte podem ser tão injustas quanto cruéis, destituídas de moral, ética, humanidade ou mesmo fé.
Em Portugal
Diogo Alves, nascido na Galiza em 1810, foi enforcado às 14:15 do dia 19 de Fevereiro de 1841, no cais do Tojo em Lisboa, aos 26 anos de idade. Motivo da condenação: O assassinato da família de um médico, com a participação de outros elementos da quadrilha. É o que consta dos autos. No entanto, ele ficou conhecido como o “assassino do aqueduto das águas livres”. Segundo opinião popular, indícios, notícias de jornais e conversas à volta da lareira, Diogo Alves teria conseguido as chaves das portas de acesso ao aqueduto das águas livres, que conduz água para Lisboa até hoje, e de lá jogava suas vítimas que previamente assaltava, do arco do vão central, a 65 metros de altura. Teria jogado mais de 70 pessoas lá do alto. Como se dizia que pessoas se suicidavam jogando-se desse local, é possível que o numero de mortes ascendessem a muito mais do que essas 70. A cabeça de Diogo Alves ainda existe conservada em formol na Faculdade de Medicina de Lisboa. Fora arrancada logo após a morte por estudantes dessa instituição para estudo. Evidentemente, nada concluíram.
No Brasil
O fazendeiro Manoel da Motta Coqueiro, foi executado, por enforcamento, no dia 06 de março de 1855, em Macaé no Estado do Rio de Janeiro. Motivo do crime: O assassinato de oito membros de uma família de colonos que trabalhavam em uma de suas propriedades localizada em Macabu. Correndo notícia de boca em boca e pelos jornais, o povo deu-lhe o apelido de “a fera de Macabu”. Logo após a prisão, declarou-se inocente e pediu a graça Imperial do perdão ao imperador D. Pedro II que a negou. Foi o primeiro homem rico, de alta posição social a ser enforcado no Brasil, e também o último a sofrer pena de morte.
Porém, pouco tempo após a morte, ficou provado um erro judiciário. Manoel da Motta Coqueiro era realmente inocente. Abalado com o erro, D. Pedro II passou a negar a condenação à morte a todos os condenados. Em 1891, finalmente, a pena de morte foi abolida da constituição e das leis brasileiras. Exceção para casos de guerra, como consta da Constituição, vigente, de 1988.
No Reino Unido
Liam Holden cumpriu 17 anos de prisão depois de condenado como franco-atirador do IRA e condenado à morte. Motivo do crime: Ter morto a tiros um adolescente do Regimento de Pára-quedistas, Frank Bell, em Belfast, 1972, Jurando inocência, entrou com recurso. A pena foi comutada para prisão perpétua. Depois de 40 anos de prisão, a Comissão de Revisão de Processos Criminais verificou que a confissão de Liam Holden tinha sido obtida - de forma ilegal – através do método de asfixia por água, “waterboarding” numas instalações do próprio regimento ao qual pertencia a vítima, um soldado, apesar da sua adolescência. Logo após a sentença de Holden ser comutada para prisão perpétua, a pena de morte foi abolida na Irlanda do Norte o que já era fato em todo o Reino Unido.
Em Cuba
Humberto Real foi condenado à morte em Cuba, em 1996. Motivo do crime: “crimes contra a segurança do Estado, assassinato e disparo de arma de fogo contra determinada pessoa”. Humberto real fazia parte de um grupo denominado PNUD que se infiltrou no norte da ilha, proveniente da Flórida, EUA, em 1994 e matou um cidadão cubano. Desde o ano 2000 existe uma moratória sobre a pena de morte, interrompida em 2003 quando o governo cubano fuzilou três cidadãos que, numa embarcação, pretendiam emigrar para os EUA. Recentemente Raul Castro converteu a pena de morte de Humberto Real a uma pena de 30 anos de prisão. Há outros casos em estudo para comutação de pena pelo governo de Cuba.
No Irã
Yousef Nadarkhani converteu-se ao cristianismo na adolescência. Reclamou do governo a obrigação de forçar crianças a lerem o Alcorão. Ao tentar registrar a sua igreja evangélica na cidade iraniana de Rasht, foi preso. Motivo do crime: Apostasia - quando se renuncia à fé à qual se pertence. Foi condenado à morte por enforcamento. Em todo o mundo foram feitas campanhas para que o governo do Irã revisasse essa decisão, inclusivamente via Internet e durante o evento Rio +20. No dia oito de setembro de 2012, o pastor teve sua pena revista para prisão domiciliar. Teme-se pela morte “acidental” do pastor, já que outros pastores foram enforcados pelo regime do Irã.
EUA
John Errol Ferguson, com 64 anos é reconhecidamente esquizofrênico e acredita ser o “príncipe de Deus”. Foi condenado à morte no estado americano da Flórida. Motivo da condenação: Assassinato de seis pessoas em Carol City em julho de 1977 e de outras duas em 1978 em Hialeah, cidades do condado de Miami-Dade. O pedido de clemência foi rejeitado pela Suprema Corte. Dia 16 de outubro deveria ser executado com injeção letal, após 35 anos no corredor da morte, mas mais uma vez, por força de dúvidas sobre sua sanidade mental – o que parece evidente, porque além de tudo acredita que após sua morte voltará para livrar os EUA do comunismo – sua morte voltou a ser adiada no passado dia 24 de outubro de 2012.
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Doenças mentais devem ser tratadas. Doentes mentais passíveis de surtos perigosos para a segurança pública devem sofrer vigilância médica adequada. A prevalecer a pena de morte, deve ser estendida aos que provocam a “morte invisível” quando pessoas morrem em filas de hospitais, ou por fome, ou por esgotos a céu aberto, ou, em geral, por negligência do Estado porque houve desvio de verbas que nunca chegaram ao ponto final de sua aplicação no benefício das populações que pagam os seus impostos – e como pagam!
Rui Rodrigues