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domingo, 26 de maio de 2019

A grande trama do Panteon


Na grande sala escura do Panteon reinava a escuridão. Na outra grande sala nem luz havia porque não tinha sido ainda inventada, mas deuses não precisam ser iluminados para existirem e pensarem, nem de membros pensantes, locomotivos ou reprodutores para pensarem, se locomoverem ou reproduzirem... Se tiver a oportunidade de ver um deus, como eu vi, verá que não verá nada. Absolutamente nada, porque existem e ninguém os vê. 


E isto é uma prova cabal de que existem e não podem ser vistos: A luz não reflete neles. Um me disse no Bar, num dia em que fechamos para limpeza geral e dedetização:


- Faz-me perguntas enquanto estou aqui. É um prêmio que nós do Panteão te damos por seres um felizardo da vida, grande mérito entre nós, porque bandidos não são felizes. Não gostamos de bandidos. Bandidos só roubam o que podem, jamais o que não têm, nem nunca poerão ter, como inteligência, por exemplo. Vamos... Pergunta!


- Como foi mesmo o Bigue-bangue?


- Nós, deuses, não somos deste Universo nem de nenhum outro. Nós criamos universos para propiciar vida. Criamos universos como quem faz um bolo. Quem faz o bolo não pode ser um ingrediente desse bolo nem de nenhum outro. E quantos menos planetas sem vida houver, menos probabilidades de as vidas se encontrarem r exterminarem umas às outras... Por isso que vós, da Terra, olhais ao redor e não encontram vida em nenhum outro planeta.


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(E ele foi "falando" sem emitir um único som:)


- Então  nos reunimos uma única vez na grande sala escura para fazermos os universos. Mas tivemos um pequeno problema. Seja o que for que seja absolutamente escuro, sem sons, aparentando ser o nada, não é o "nada". Nada é uma palavra que gente vivente que nada sabia inventou para definir o que nada sabia: O Nada! Mas nada não existe. Sempre aparecem amiúde partículas extremamente simples, ou se esperarmos uma eternidade poderemos ver aparecer objetos mais complexos.


(Eu estava entendendo perfeitamente o que ele dizia, mas procurava evidências de sua presença, mas nem um sopro de vento, uma brisa, um raio de luz... Nada. Nada de sinais que eu pudesse atribuir-lhe. E continuou:)


- Nós estávamos ali para fazer universos. Não temos hierarquia. Somos apenas deuses cheios de imensos poderes. Mas como disse, tivemos um pequeno problema. Na verdade, um segundo problema, porque o primeiro era a construção da grande sala escura onde criaríamos os universos. Ou o nada dessa sala éramos nós mesmos, ou então tínhamos criado essa sala e esse nada, mas esse nada já continha todas as leis de formação de universos com estrelas, galáxias, planetas, cometas, nebulosas, buracos negros... Soubemos disso quando pipocou o segundo problema...


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(O único sinal do deus que julguei perceber foi as "entonações" das frases dadas pelo ritmo das palavras. Julguei assim perceber que deus estava irritado por uma grande frustração. Disse-me:) 


- Ora imagine você, terráqueo dono de um Bar que vende Chopp Grátis mas é bom sujeito e tem uma sócia dona de uns peitos, um belo par de pernas, lábios, cintura, ancas, bunda, de fechar o comércio, mulher dessas de deixar qualquer deus tarado - perdoe-me o á parte, mas não pude me segurar - ora imagine você, dizia eu, que quando o primeiro de nós, deuses, ia abrir a boca, e me parece até que era o Aúra-Mazda dos babilônios, ou persas, cria do Zaratustra, quando de repente houve uma imensa explosão e os universos começaram a pipocar uns atrás dos outros, ao lado dos outros, por todos os lados... Uns implodiam, outros inflavam mais ou menos rápido. A sala escura já continha todas as leis para formação dos universos... Sentimo-nos frustados, sem importância. Afinal, os universos podiam formar-se sem nós, partindo de partículas extremamente simples que surgiam e surgem do "nada"...


(Eu estava embasbacado... Mas me enchi de coragem e perguntei:)


- Então... Porque existis vós, ó deuses do Panteão que habitais na grande sala da luz?


- Ah! Sim... Basta que penses numa "coisa", qualquer coisa, e contes aos outros da tua espécie sobre essa coisa, que ela ássa a existir, se os da tua espécie gostarem dessa coisa, ou falar sobre ela... E depois os da tua espécie se juntam em grupos, cada um gostando de suas "coisas", e brigam entre si, disputando lugares na hierarquia para ver quem tem o deus mais importante... E se um dia vos encontrardes com seres de outros planetas, vereis que eles, a quem chamais de extraterrestres, "possuem" outros deuses... Todos ausentes, que não refletem a luz, que não falam...


Malena, a minha sócia gostosa estava com suas mãos me acariciando onde mais gosto e me sussurrava no ouvido com seu sotaque bem argentino: - Estás pensando en mí , meo amor... Que te veo tan lonxe!...


Até hoje não sei que raio foi aquilo de ver um deus que me pareceu ser de verdade, se for verdade que tudo aquilo em que pensamos e os outros gostam se pode tornar numa realidade, pelo menos por algum tempo. Afinal, Apolo, Zeus, Osíris e Afrodite já morreram... 


Ninguém mais lhes reza.


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Malena, a minha sócia gostosa, argentina comunista da boca pra fora e capitalista da boca pra dentro, é a minha "deusa" atual. Ela transforma minha tristeza em prazer total sem precisar de drogas. 


Rui Rodrigues

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