Estudei Freud e Carl Jung por conta própria. Não sou formado em psicologia nem expert no assunto, mas creio entender algumas coisas fundamentais, baseado numa experiência de vida lidando com gente simples e trabalhadora e com gente mais complicada, bem mais, mas não menos trabalhadora: Uns usam ferramentas pesadas manuais, outros apenas canetas ou calculadoras. Muitos aspectos em comum, e um deles por mais incrível que pareça, é que todos somos vendedores. Uns vendem conhecimento, outros imagem, outros o sangue, vende-se tudo o que se tem de melhor e de pior para nos mantermos ativos, alimentados, vestidos, com um lugar para dormir. Vendemos momentos, corpos, vidas ou parte delas. Somos venais de nós mesmos, mas jamais o admitimos: Dizemo-nos que temos o nosso próprio valor, que merecemos ter o que queremos pagando um preço que julgamos justo. Exemplos?
O sentimento de perda quando o vendedor ou a vendedora não consegue nos satisfazer pelo preço que queremos para comprar um objeto. Rejeitamos o objeto, mas apenas porque o preço não cabe no nosso orçamento, mas jamais porque não o desejamos. Outro exemplo? A namorada que se foi porque não lhe satisfizemos os desejos por mais inusitados que pudessem ser, fossem simples ou difíceis de aceitar. Dizemo-nos que não podemos aceitar tal situação, porque na verdade, temos um preço comparativo para essas situações: O nosso próprio preço. Nada pode ser mais caro do que o valor que atribuímos a nós mesmos.
O que poderia fazer baixar ou subir o nosso próprio valor, aquele que atribuímos a nós mesmos? Creio ser a nossa auto-estima. Quando estamos “por baixo”, nosso valor é tão baixo que ficamos envergonhados. É uma ilusão dizer que nos vendemos apenas “nesta situação”. Quanto mais nos vendemos por pouca coisa, menos valor nos atribuiremos após essa transação. É a fortaleza de ânimo, a auto-estima, que nos mantém sempre num valor determinado por nossa consciência. Mas nada, nem coisas nem pessoas, têm apenas um atributo, como dimensões, cores, inércia, vida, cabelos, olhos, corpo e mente. São muitos os aspectos que definem uma coisa, um ser, uma pessoa. Alguns são apenas aceitáveis, outros detestáveis e outros ainda interessantes, agradáveis. Lembrar de coisas detestáveis é martírio para quem lembra. Melhor e mais saudável pensar apenas nas coisas boas, se não se puder evitar a lembrança. Lembranças pipocam sem nosso próprio controle. Provavelmente são guardadas no bulbo raquidiano (ou complexo reptiliano) ou existe alguma ligação entre esse bulbo (que não podemos controlar) e o neocortex cerebral, onde se realizam as operações de raciocínio, se é que não existe uma “lembrança” genética inserida em cada gene que portamos em nosso corpo, mas não poderiam ter lembranças muito recentes de nossa vida. Apenas de experiências, as mais importantes, de forma a preparar a melhor adaptação para as gerações futuras, num processo de evolução face ao ambiente em que vivemos.
Quando deixamos de comprar um objeto porque o desejamos mas ou o preço é caro ou não temos como usá-lo, convém que nossas lembranças convirjam para a beleza, para a imagem, para o momento em que estivemos tão perto que o tocamos ou poderíamos ter tocado, e só. Alimentar o desconforto de não o possuirmos é um erro que nos custa bons momentos de alegria, de felicidade, perdidos em pensamentos que nos podem deprimir. É assim com amores não correspondidos, com filhos que não nos entendem, com pais que não perceberam do que não gostávamos, e com nós próprios, com o que fizemos ou deixamos de fazer.
No que respeita a nós próprios, os erros são aprendizados para não voltarmos a errar. Não errar deve ser entendido como um prazer incomensurável, o melhor da vida. Dá-nos força, motivação, personalidade e com o maior respeito por todos os demais de nossa espécie, nos leva ao topo do mundo. Não errar deveria ser o objetivo de todos nós. Este mundo seria muito e muito melhor. Ou, se isso for impossível, que se erre o menos possível. Lembranças?
Só as boas, e poderemos amar ao próximo não importa o que nos tenha feito, porque pelo menos em alguma coisa nos foi útil. E nossa vida só terá boas lembranças. Viver fica mais e muito, mais fácil. Por isso, quando tentam nos modificar, ou por amor tentamos modificar-nos a nós mesmos, perdemos algo de nossa personalidade. Melhor abandonar quem nos tenta modificar, do que viver o resto da vida lamentando a modificação. A não ser quando é para nos melhorarmos e não para satisfazer simples vontades modais, de oportunidade ou conveniências.
® Rui Rodrigues
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