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sábado, 25 de abril de 2015

Os Mercados Globais





E certo dia a primeira caravana decidiu-se a partir em busca de lucros. Levava o que tinha porque tinha ou porque houvesse comprado vindo das fronteiras e levava para outros povos fazendo a troca por produtos que seriam vendidos na volta dentro de suas fronteiras. Os donos das caravanas, porque as caravanas tinham donos, os investidores, lucravam duas vezes: Na ida e na volta, exceto quando sofriam ataques de bandidos pelo caminho. Antes de partirem, porém, já os governos dos países que as caravanas iriam atravessar haviam feito acordos para passagem e venda. E a Terra se encheu de rastros de patas de muares cavalos e camelos, de navios singrando mares calmos e bravios, duras pedras de estradas romanas ficaram sulcadas pelas rodas ferradas de suas carroças. Comerciantes passaram a viajar pelo mundo, o mundo tornou-se mais conhecido, menor, a concorrência aumentou, houve duras batalhas pelo comércio, que se não fosse pela economia, o era pela religião, mas sempre pela força. Que nem só com espadas e canhões se mostra a força. O comércio tem o dinheiro que dá, ou tira, a força a governos. A religião diz se deve ou não haver calma.


Num mundo sem religião sobrariam o comércio e a força, num outro sem força sobraria o comércio e a religião, num outro ainda sem comércio sobraria a religião e a força, caros leitores, num grau de intensidade de 0 a 10 de cada um destes três fatores escolham o melhor que lhes convém, que nada para além disto determina as filosofias políticas nem os governos que temos. Nosso mundo reflete exatamente isto.Ficou famosa a Rota da Seda. 

Mas o que se vendia pelos idos da antiguidade e até o século XIX?



Havia mercados enormes no Cairo Lisboa e Xangai; Jerusalém Paris e Oslo; Tunis Alexandria e Istambul; Veneza Moscou e Atenas; Tiro Londres e Cabul; Casablanca Madrid e Alepo; Roma Teerã e Katmandu; Pequim Calecute e Trípoli; Rabat Tóquio e Ulan Bator, e em muitas outras. Vendiam de tudo que não se deteriorasse: Ouro e prata eram geralmente as “mercadorias” para base de troca. Depois que se inventou o dinheiro, as moedas, as trocas ficaram muito e muito mais fáceis, aumentando o comércio. Vendiam-se tecidos de seda da China, ânforas de vinho da Grécia, Roma, Jerusalém, espadas de bronze do Egito e de ferro de Constantinopla (Istambul), bordados de linho e filigranas de ouro de Lisboa, especiarias de Calecute, marfins do Cairo, tapetes de Cabul, queijos de Rabat e de Paris, azeite de Trípoli, madeiras perfumadas de todo o oriente. Eram mercadorias de peso, de valor indubitável, porque eram “pesadas”, avaliadas até à vista. Existiam. Eram “palpáveis”. Podiam guardar-se, servir como “economia” e venderem-se mais tarde. Muitas chegaram até nós e valem fortunas.


Muitos séculos depois, novos mercados apareceram: Rio de Janeiro, Washington, N. York, São Paulo, Buenos Aires, Santiago do Chile, Panamá, Barranquilla, Lima, Antananarivo, Luanda, Maputo, Adelaide, Montego Bay... E muitas outras que para os efeitos nem é necessário nomear. Mas o que vale a pena indicar pelo menos, é que os produtos se diversificaram bastante. Agora se vendem armas, petróleo, veículos, terras de minérios que mudam de continente, navios, aviões, trens, remédios, perfumes sofisticados, e os mesmos tecidos, os mesmos vinhos, os mesmos queijos, sapatos, roupas, cada vez mais caras por mais que a mão de obra seja substituída por robôs, e as máquinas produzam milhares de vezes mais peças que antigamente. Há uma “inflação” invisível, surda e muda, da qual ninguém fala, que não se vê e da qual nada se escuta. Só se sente.  Os primeiros carros Ford foram vendidos a 850 dólares cada – e note-se que eram novidade e caros - e hoje, o Ford Ka que é o mais barato, custa em média 5.000 dólares no Brasil. Das outras marcas nem se fala porque os preços aumentaram ainda mais absurdamente. È desta “inflação” surda a que me refiro.
Em menos de duzentos anos estamos comprando virtualidades que no fundo só servem para aprendizado ou como comunicação. O resto é perda de tempo. São os famosos gigabytes que circulam pelo espaço em ondas de energia enviadas por equipamentos que se comunicam com satélites no espaço e refletem o sinal para os lares e “celu-lares” de cada um. Coloquei um tracinho em celulares porque passaram a ser o lar de quase toda a humanidade, substituindo a sala, o jantar, a cama e o sexo... Quando em 2000 voltei do Chile encerrando minha participação num mutirão de cinco indivíduos que destrinchávamos uma série de reclamações contratuais referentes à Mina de Los Pelambres no Chile, entrei de gaiato no projeto que implementava as primeiras transmissões via satélite para todo o Brasil, de norte a sul, leste a oeste, pela Intelig. Digo de gaiato porque me indispus com a diretoria da empresa que me colocou lá por não me quererem dar férias atrasadas e terem dado a um outro individuo porque tinha que voltar ao Chile para apanhar seu cachorrinho, e, aproveitando o ensejo, tiraria suas férias em dia... Como não tinha cachorro, e teria que ser eu ainda por cima a fazer o trabalho dele, e como sou hetero, pedi demissão, não sem antes entrar com atestado médico. Eu estava esgotado. Subir a cordilheira andina uma vez por semana a 3.800 metros de altitude, durante quase um ano, cansa e dá raiva quando não se é compreendido. Quem criou o problema foi um sujeito que dizia: Aqui dividimos tudo! E eu nunca tive nada para dividir. Era motorista de seu próprio carro como qualquer Jarbas de que falam as histórias em quadrinhos.



Mas note-se que o minuto custava para cada empresa – e depois retransmitir aos usuários - a fabulosa quantia [1]de $ 0,0001 Real e passou a ser vendida a cerca de três reais o minuto... Evidentemente que o Ministro das Telecomunicações deve saber quanto custa a cada empresa, das quatro ou cinco que dividem o bolo. Todos os ministros deveriam saber sem poderem alegar que não sabiam.

É este o mercado e a forma como se fazem as transações, e de como influem governos. Por petróleo até se declara guerra ou se perde a cabeça de um governo. E quem se atreve a pedir registro das telecomunicações corrompidas pelos corruptos?  

® Rui Rodrigues  

  




[1] Já incluídos os custos com transportes de satélites via foguetes, linhas de transmissão, etc... 

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