CABUM
- Não sou vidente
Não sou vidente. Li tudo o que podia na História Universal e livros de todas as matérias, e não tenho por costume enganar-me, mas erro por vezes nos prazos. Algumas coisas acontecem antes, outra depois do “quando” em que previ que iriam acontecer. Ultimamente tenho me limitado a referir-me a longo, médio e curto prazo. São os sinais. São os sinais que analisados em conjunto, nos apontam o caminho, embora não bem definido, para onde o mundo, a humanidade, vão. A história se repete assim como a natureza se repete em folhas, rios, flores, com as mesmas características básicas, embora o aspecto seja sutilmente diferente, como entre uma rosa e uma tulipa, ou uma folha de álamo e uma de parreira.
Parece haver uma ordem no mundo e na natureza, também na humanidade, que não conseguimos ainda definir nem no mais moderno e mais potente computador. Essa ordem, constituída por leis, define os rumos, o caminho do mundo que nos cerca. Vejamos por exemplo, o caso do mundo na época de Hitler, em 1939, quando sob seu comando a Alemanha aliada à Áustria invadiu de forma imprevisível a Polônia e deu inicio à segunda guerra mundial.
- A desordem na metade do século XX
Naquela época, até um ano antes do conflito, mais ou menos, o mundo parecia estar saindo de uma recessão violenta que levou para as ruas em extrema pobreza, filas e filas de desempregados buscando algum tipo de emprego para garantir o sustento. Jornalistas que percorrem o mundo e tem seus contatos, alertavam sobre os perigos de uma Alemanha que, contrariando o Tratado de Versalhes, se militarizava e treinava suas tropas em outros países, já que estava proibida de fazê-lo. Todas as forças armadas de todo o mundo europeu sabiam sobre os acontecimentos, os cidadãos de todas as nações sabiam da instabilidade, do armamento, da pobreza espalhada, e os que alertavam pareciam não ter crédito. A vida continuava, algumas instituições ajudavam os mais necessitados, dançava-se o “Fox Trot” herdado dos anos 20 por todas as casas de diversão, os cinemas estavam cheios, havia glamour por todos os cantos do planeta. O mundo, apesar das notícias, era um encolher de ombros, uma descrença de desgraça. Quem falasse no perigo, era “pessimista” que incomodava quem queria viver em paz, longe desses assuntos, curtir a vida. Já se vendiam rádios ou goniômetros, que aliviavam a vida em casa, disseminavam notícias. As ruas já estavam cheias de ônibus, automóveis, lojas com as ultimas novidades da moda. Parecia que nada de novo poderia ser inventado, e as “invenções” que apareciam em gibis, eram pura ficção cientifica, impossíveis de serem fabricadas. Alguns cientistas e estudantes de universidades acreditavam, nas ninguém acreditava neles. Ainda se morria de pneumonia, de sífilis, pelas ruas crianças portavam aparelhos para permitir a locomoção, impedida pela paralisia infantil. O mundo parecia que não iria mudar sensivelmente. Os sinais de perigo pareciam boatos infundados, e mesmo que fossem verdadeiros o pior jamais aconteceria. Não tinham a mínima noção do que poderia ser o “pior”.
A humanidade é feita de sobressaltos que provocam saltos repentinos, mas também é muito paciente e desfocada até que venham os sobressaltos. Passa por cima dos sinais, que despreza. É como se a humanidade não tivesse adrenalina e não sentisse os sinais de perigo. A alienação parece ser conveniente para não perder os prazeres e confortos da vida. E quando chegam os tempos de guerra, adota-se o lema de que “é preciso viver a vida” mesmo sabendo-se de soldados mortos no front. A vida corre normal longe dele, como se a guerra não existisse. E poucos se lembram daqueles tempos recentes, pouco tempo atrás, quando não deram ouvidos aos sinais. A recessão poderia ter sido evitada, a guerra evitada.
Durante a guerra a humanidade viveu aos saltos e sobressaltos, e inovações tecnológicas ultrapassaram a ficção dos gibis. Surgiram foguetes, aviões modernos movidos a jato, vacinas, penicilina, e a energia nuclear, bombas nucleares. Cometeram-se atrocidades como o holocausto, e nem a guerra havia ainda terminado e dois aliados, EUA e URSS começaram a envolver-se em espionagem industrial, numa guerra fria. Na verdade, e muito mais do que isso, numa guerra fria entre o comunismo russo e o capitalismo ocidental. Fora o capitalismo ocidental quem vencera a guerra. Já no passado os “bárbaros”, em sua maior parte germanos, haviam invadido Roma. Durante as cruzadas foram parte presente e constante em todas as batalhas. Em 1914 declararam guerra ao mundo e perderam. Agora, em 1945, amargavam mais uma derrota assim como o seu aliado Japão e a irrequieta Itália, herdada de Roma. A guerra chegou irremediavelmente ao fim com o uso de duas bombas atômicas lançadas pelos EUA contra o Japão.
- A reposição da ordem e a preparação para a desordem.
O período do pós-guerra foi muito difícil, mas regado com a esperança de reconstruir um mundo novo. O mundo novo foi reconstruído sem que a humanidade houvesse parado com as guerras entre si. Foi difícil em meio a uma guerra fria incluindo a queda de braço entre ocidente e a URSS devido aos mísseis de Cuba, guerra na Coréia, no Vietnam, revoltas, genocídios em África, até a queda do muro de Berlim, a Perestroika, o fim do comunismo. O comunismo só sobrevive enquanto houver dinheiro disponível nos mercados que o sustentem. Sem dinheiro não é possível financiar projetos, comprar equipamentos no mercado exterior. O mercado de “trocas”, do gosto comunista, sem o uso de dinheiro, sempre dá vantagem ao outro lado que o tem.
Todos os anos os jornais se têm enchido de noticias de guerra em todos os continentes exceto nas Américas. Não fugimos à luta por aqui, mas detestamos guerras. Houve uma guerra sim, entre a Argentina e a Inglaterra, que demorou mais a terminar pela distância que a Inglaterra teve que percorrer até chegar à Argentina. Afora isso, somos um continente em paz. Deveríamos estar orgulhosos disso, termos um progresso social que se pudesse constatar ao viajar pelos países, e não pelos números de progresso que as propagandas de governo alardeiam e que contrastam com a realidade visível, até porque não temos despesas de guerra. No entanto quer os EUA, quer a Europa, os mercados que sustentam o restante do mundo por seu poder de compra e seu espírito consumidor, estão em recessão técnica, com grande retraimento e compram menos no mercado dos países emergentes e nos demais. A crise foi provocada por erros do sistema bancário, posteriormente cobertos com verbas públicas praticamente doadas por todos os governos para evitar uma crise inevitável: A política, porque mesmo com a crise econômica resolvida, era de esperar uma crise política por deterioração dos serviços públicos e da oferta de emprego. A crise política chegou, mesmo antes de resolvida a crise econômica mundial.
- O começo de nova desordem mundial.
Acontecimentos ao redor do mundo nos mostram os preparativos para a desordem, dos quais podemos listar alguns mais importantes, por seu impacto no ideário mundial de ansiedade por um mundo de paz, de tranqüilidade, próspero com bem estar e emprego para todos (sem preocupação com ordem cronológica):
- Movimentos de rua no Brasil, na Inglaterra, na França, na Itália, na Irlanda, na Grécia, na Rússia, na Espanha, em Portugal, na Venezuela, no Chile, a primavera árabe em quase todos os países do norte de áfrica.
- A crise de credibilidade política por problemas ligados com corrupção que afetaram quase todos os países do mundo, a maior parte deles com governos socialistas.
- O esvaziamento do campo na Europa e a corrida de cidadãos para as cidades em busca de emprego. Alguns países chegam a ter 40% de desemprego [1] entre a juventude. Recomeça novo ciclo de emigração para países onde ainda – AINDA - há trabalho.
- O aparecimento de cidades fantasmas na China [2], e a bancarrota declarada da cidade de Detroit nos EUA [3]
- A propaganda (falsa) de governos que para se sustentarem usam a propaganda para mostrar que a economia vai bem, que tudo vai bem, quando se nota pela realidade que tudo vai mal. Isto provoca ainda mais indignação popular e os partidos e os políticos perdem a credibilidade.
- A mobilização social que desvenda os erros e a corrupção e desmascara a propaganda dos governos.
- A busca de novo modelo de Constituição e da forma de governar que resolvam o que os modelos até agora existentes não conseguiram solucionar. Quem pede é a sociedade mais esclarecida, e agora, devido á crise econômica, também os partidos de esquerda e socialistas que perdem poder aquisitivo com a crise.
Para quem estuda história e lê tudo que esteja ao seu alcance, não é difícil entender que estamos no limiar de uma nova e verdadeira crise ampla mundial que envolve não só a economia como a política. É certo que é necessário melhorar a educação – sempre – em todos os países, mas o conhecimento atual da população mundial, grandemente proporcionada pelas redes sociais, já é suficiente para que se entenda que o mundo como está, não está bem e precisa ser mudado.
Eu proponho a Democracia Participativa [4] começando pela aprovação de nova constituição votada item por item pelas redes sociais. O povo sabe o que quer. Os governos devem obedecer, porque foram eleitos para isso.
O mais urgente possível, antes que aconteça novo CABUM... E o mundo se envolva novamente em conflitos nacionais e internacionais, iniciando novamente longo estado de instabilidade e violência. Para uma geração que não conheceu a guerra, outra seria uma desagradável surpresa. As guerras começam quando há muitos desempregados, não há perspectivas de vida decente em curto prazo, e qualquer outra atitude, que se pensa ser para “mudar”, começa a ser bem vinda...
© Rui Rodrigues
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