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segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Conflito Israel-palestino - O cerne da questão



(Ou, o cadinho Sírio-Palestino e Israel na terra de Canaã).

Há sempre a curiosidade de saber qual a posição do autor de texto sobre o que pensa a respeito do que escreve. Abrindo minha alma à curiosidade pública, acredito em D’Us do povo hebreu com uma particularidade: D’us não é como se imagina. Foi imaginado de acordo com os conhecimentos da época. Já evoluímos o bastante para termos uma visão de Deus melhorada, mais evoluída. Na medida em que evoluímos, D”us se revela na mesma medida. Por isso posso compreender cristãos e muçulmanos, hindus e xamans, espíritas e judeus, qualquer religião deste planeta, quer das que jazem no pó, quer das que ainda serão criadas. A busca pela verdadeira natureza de D”us é constante, um motivo da vida neste planeta.

Quanto mais soubermos dos fundamentos da idiossincrasia dos povos do Oriente Médio, e em particular da região palestina, mais preparados poderemos estar para resolvermos a crise milenar que assola a região. Se naqueles tempos de cerca de 3.200 anos atrás, os povos não estavam preparados para uma convivência pacífica e agora ainda pareçam não estar, certamente começa a ser possível, até porque o nível de instrução e conhecimento dos povos da região e de sua história é mais desenvolvido do que antes. Se tivermos evoluído para uma espécie mais inteligente, mais humana, a crise se resolverá rapidamente e da melhor forma para toda a região.

Três fatores são determinantes nas discórdias entre as nações desta região: A economia e a religião de um lado que podem ser mais facilmente resolvidos e a idiossincrasia. O problema maior está na idiossincrasia delineada por milênios de religião e fatores econômicos.

Ugarit e a terra de Canaã.

Ugarit, cidade Cananéia da antiguidade é importante por sua relação com o povo hebreu ou Habiru conforme eram chamados pelos egípcios, e por seus textos deixados em escrita cuneiforme, atestando contratos políticos e comerciais e textos religiosos.
Ugarit, uma cidade portuária, situava-se onde hoje existe a cidade de Ras Shamra na costa mediterrânica a norte da Síria. Desde 1928, quando as suas ruínas foram descobertas, que se vêm efetuando escavações arqueológicas. Os primeiros assentamentos no entorno da cidade situam-se em cerca de 8.000 anos atrás quando foi construído um muro enorme em torno da cidade. Era uma cidade muito próspera, localizada entre as cidades bíblicas de Ur e Eridu.  Para se ter uma idéia de sua importância e desenvolvimento, por volta do ano de 1.450 AC contava com quatro enormes bibliotecas – escrita cuneiforme em placas de argila – com textos nas línguas Suméria, Hurrita, egípcia, luvita, eteocretense, Acádia e Ugarítica (30 letras correspondentes a sons, sendo 27 consoantes e apenas 3 vogais que podem ter dado origem ao alfabeto fenício, extremamente similar). Uma biblioteca ficava no palácio, outra no templo de Ba’al e duas eram particulares. Não admira por ser porto de entrada para a região do Tigre e do Eufrates de mercadorias que chegavam desde portos continentais europeus e da ilha de Creta. 

Temos que nos habituar à idéia de que naqueles tempos havia cultura, economia, religião, sociedades que começavam a construir pólos de desenvolvimento social. Ugarit tinha um palácio enorme com oito pátios internos, suntuoso com 90 quartos e dois templos enormes no topo da colina da cidade: Um destinado ao deus Ba’al, filho de El, e outro ao deus Dagon da fertilidade e do trigo. As cidades de então eram cidades-estado com maior ou menor área de influência. Ugarit pagava tributo aos faraós do Egito.

A partir de El, o “Pai da Humanidade”, o “Criador da Criação”, o Deus superior de um panteão de deuses que foram surgindo, a influência religiosa acabou afetando as relações entre as cidades-estado. Os deuses dessa época eram eminentemente guerreiros, e cada cidade-estado achava que seu deus era melhor, mais forte, controlava a natureza e a sua sociedade, protegia seus exércitos. Um dos legados mais importantes encontrados nas escavações foram textos intitulados “Ciclo de Ba’al” que descrevem a base da religião e do culto a Ba’al o deus das terras de Canaã. Filho de El. Helohims (daí deriva El), cuja corte contava com muitos deuses: Hadad, Yam, Asserá ou Athirat, Shahar, Thirosh, Shalim, e outros.


O povo hebreu ou israelita

O povo israelita chegou tarde a Canaã, por volta de 1.200 AC, a julgar pelas mais recentes escavações realizadas na região, instalando-se em pequenas aldeias não fortificadas, perto de cidades-estado. Isso aconteceu justamente quando Ugarit estava chegando ao final de seu declínio. A Torá, ou Antigo Testamento foi coligido entre 600 AC e 100 AC. baseado em fortes tradições e segundo interpretação de quem escreveu seus textos. Alguns historiadores dizem que estas aldeias israelitas foram fundadas por camponeses que conseguiram subtrair-se ao controle das cidades-estado. Outros dizem que foram fundadas por imigrantes nômades de Edom e Moab. Outra hipótese é a de que os Habirus (semelhante a hebreus) que viviam no Egito á margem da sociedade egípcia, trabalhadores das obras de Ramses II (1304- 1237 AC) tenham saído para viver na terra de Canaã, dando consistência aos relatos bíblicos.
Seja como for, é fato assente que o povo de Israel dividiu a terra de Canaã com os habitantes que lá já se encontravam a partir de 1.200 AC. E trouxeram uma nova religião ou criaram uma nova com base no conhecimento que tinham na época. Não pode ser por puro acaso que El passou a ser o Deus da criação, o único Deus de Israel e dos Universos, após uma fase em que adoravam vários deuses. Foi como se Israel procurasse a sua identidade, a sua idiossincrasia como um povo independente, com um Deus guerreiro e protetor que consolidasse sua soberania perante os demais povos. Tinha o mesmo direito do que os outros. A ocupação da terra era assim naqueles tempos e sempre foi dessa forma ao longo da história: A conquista "apoiada" numa entidade divina que garantia o sucesso do empreendimento. 

O povo hebreu, habitando pequenas aldeias na região, manteve-se à margem das cidades-estado cananeias até cerca de 1.000 AC, quando uma combinação de fatores políticos e econômicos levou à formação do Estado de Israel com governo centralizado num rei, Saul. A organização política foi copiada do novo império egípcio; a burocracia foi recrutada das cidades-estado cananeias  pelo menos aparentemente; a ideologia baseava-se em modelos mesopotâmicos e cananeus.  O segundo rei de Israel, David, unificou os dois grupos em que os hebreus estavam divididos e não raro lutavam entre si: O Meridional e o Setentrional. Ele e seu filho Salomão governaram ambos os grupos a partir da cidade de Jerusalém, a meio caminho entre o Norte e o Sul. Apesar de todos os cuidados o povo hebreu não se sentia seguro face ao poderio das cidades-estado nas fronteiras de seu território.

Seus temores eram verídicos. Cerca de 720 AC o reino israelita setentrional, ou reino de Israel, foi reduzido à condição de vassalo, depois abolido e o território convertido em mais uma província Assíria. A classe dominante israelita dispersa por várias províncias assírias. O povo se integrou às novas sociedades para onde foi levado. O reino Meridional, ou reino de Judá tornou-se um estado vassalo dos Assírios. No final do século VIII AC, o império Assírio foi sobrepujado por uma coalizão dominada pela Babilônia que imediatamente invadiu e tomou toda a Síria-Palestina. Em 597 AC, Nabucodonosor da babilônia, insatisfeito com o comportamento do rei de Judá ocupou Jerusalém e nomeou outro rei, além de deportar todos os artífices, letrados, ricos, metalúrgicos. Este rei tentou rebelar-se e mais uma vez. Em 586 AC, Nabucodonosor invade Jerusalém e desta vez a destrói por completo, incluindo o templo de Salomão. O rei assistiu à execução de seus próprios filhos, foi cegado e deportado. Tal era a raiva contra o povo hebreu na região e a fama que dele se espalhou como exemplo da dominação assíria e babilônia. No século VI AC o rei persa Dario permite a volta do povo judeu a suas terras.

Em 66 DC o império romano destruiu o segundo templo de Salomão e arrasou a cidade de Jerusalém. Em 135 DC, o povo judeu foi novamente expulso de suas terras, desta vez pelos romanos, no tempo do Imperador Adriano. A raiva e a fama eram desta vez espalhadas pelo povo romano.
   


Yaweh e o povo hebreu

Não se pode afirmar com certeza da origem de Yaweh, o Deus israelita, que, por mais que tentem esquecer, ou dissociar de suas religiões, ou até mesmo lhe dar um nome diferente, é também o mesmo de cristãos de todas as facções e de muçulmanos. Deveriam regozijar-se, mas paradoxalmente, a raiva babilônica e romana parece ter-se estendido alem fronteiras e avassalado o mundo religioso. Embora o reino setentrional fosse o maior e mais poderoso, é do reino de Judá que se sabe o que sabemos a respeito de Yaweh. Uns, tal como no livro do Êxodo, dizem que Yaweh foi um deus midianita introduzido na terra de Canaã por hebreus originários do Egito. Outros, talvez com mais propriedade ou indícios, como um deus do panteão menor do povo cananeu. Assim, Yaweh seria filho de El, que chegou a ser o deus dos hebreus, porém irmão de Ba’al. El era tanto deus dos hebreus quanto dos cananeus. No “ciclo de Ba’al” é clara a afirmação “O nome de meu filho (de El) é Yaw” e no Deuteronômio 32.8 conta-nos como El Elyon, isto é, El, o Mais Exaltado dividiu as nações entre os filhos, Yaweh recebendo Israel como sua parte. Em particular, e analisando todas as religiões do mundo, somos levados a pensar que a existência de um Deus único é compreensível, mas que cada povo O entende de acordo com a sua idiossincrasia. Não se trata de vários deuses diferentes, mas do mesmo Deus, interpretado e entendido de diferentes formas.

É aqui que reside a resistência e a discordância milenar entre hebreus e palestinos ou cananeus. Este é o grande pomo de discórdia entre os dois povos: A religião e a origem distinta dos povos que deram origem a filisteus ou cananeus, e hebreus. Uma luta fratricida de irmãos que têm e sempre tiveram um Pai comum: El, do qual se originaram Yaweh e Ba’al. A luta é entre irmãos, tal como Esaú e Jacó. Podemos perguntar-nos se Esaú não representará o povo filisteu, ou cananeu, ou palestino (dá no mesmo) e Jacó o povo hebreu segundo a tradição falada e posteriormente coligida num livro religioso. As lutas entre o reino de Israel e de Judá, fratricidas por certo, podem ter uma explicação e de certa forma dar um novo sentido às atuais dissidências entre palestinos e israelitas: O território do norte de Israel teria sido ocupado por povos hebreus e o do sul pelos filisteus: O primeiro colonizado por povos provenientes da suméria ou do Egito (ou da suméria que foram para o Egito e depois ocuparam Canaã) e o segundo por povos de origem da ilha de Creta ou Micenas.  Mas nem importa... As diferenças genéticas à luz do ADN (ou DNA) tornam as diferenças raciais tão irrelevantes, que somente outros fatores de somenos importância poderiam determinar algum tipo também irrelevante de diferença entre judeus e palestinos ou qualquer outro povo deste planeta. O que parece diferenciar é a idiossincrasia cultivada ao longo de milhares de anos, formada a partir da religião e da economia.
Se olharmos os conflitos israelo-árabe e israelo-palestinos à luz da história, com isenção, somos infalivelmente levados a concluir que se trata de um conflito de “teimosia” milenar de não aceitação idiossincrática implacável. É tempo - porque é absolutamente necessário – de se reunirem as partes e de chegarem a um consenso no sentido do bem estar comum. O mundo agradeceria imensamente pela paz, e a imagem de palestinos, árabes e judeus ficaria enormemente engrandecida perante os povos da terra.

Rui Rodrigues

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