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segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

As Festas de Aniversário de Belinha


As Festas de Aniversário de Belinha



Percorrendo a NET, encontrei um site interessante sobre as festas de aniversário[1] lembrei-me imediatamente das festas de Belinha, minha amiga desde a minha velha infância. Envelhecendo juntos, acompanhei de certa forma todos os seus aniversários e com a minha velha mania de comparar tudo o que conheço, percebi que há uma relação entre a evolução do conhecimento e os atos que praticamos. No contexto das mudanças de comportamento sociais que vimos verificando, na medida do progresso da humanidade, as festas de aniversário também mudaram. E muito!

Belinha nasceu na década de 40 do século passado. Por essa época não se esperava viver mais do que sessenta anos. Hoje já se fala em expectativa de vida acima dos oitenta. Como Belinha adorava comemorar aniversários, por vezes imaginava como seriam suas comemorações quando tivesse mais de setenta anos. De lá para cá (da década de 40, do século passado), muito mudou na forma como Belinha passou a prever suas festas de aniversário.


Belinha não sabia que a origem de Aniversário – palavra que significa “tudo aquilo que volta todos os anos”, tem origem latina, nem que era um costume no Egito antigo para qualquer cidadão e na Grécia apenas para homenagear deuses e reis. Não sabia nada da origem dos costumes, mas gostava do ambiente da festa desde a emoção dos preparativos até receber os presentes e comemorar com farta mesa cheia. Depois odiava ter que ajudar a limpar tudo e verificar que alguns presentes ela detestava desde o abrir do pacote ou do embrulhinho, tudo muito decorado, mas com pouco conteúdo. Nessas ocasiões ficava com a sensação de que o doador do presente não gostava dela.  Talvez até a odiasse, e assim, no ano seguinte já nem o convidaria, mas antes, gozava da sua vingança particular: Ia a seu aniversário, e dava-lhe um presente pior do que ele lhe tinha dado. Para saber que presente seria mais odiado, pedia a amigas que sondassem junto da “vítima”. Foi perdendo amigos, fazendo outros, mas as festas de aniversário foram mudando ao longo dos anos, exatamente porque temos a mania de comparar o que damos com o que nos dão, o que fazemos com o que nos fazem. È uma medida seletiva para separar os “amigos” dos “inimigos” dos ‘indiferentes. Estes quase nunca eram convidados.  

Belinha viu muita gente que se dizia comunista cantar o “parabéns pra você” sem saberem que esta música tinha sido criada pelas irmãs americanas Mildred e Patrícia Smith Hill em 1874 para as crianças de uma escola. Também não sabiam que em 1923, o título da canção fora alterado para “happy birthday to you” – parabéns para você- depois de ser editada em livro. Muito menos ainda sabiam que a música recebeu uma versão brasileira: A rádio Tupi promoveu um concurso em 1942, para que as pessoas escolhessem uma letra que se encaixasse na melodia original. A letra escolhida, entre cerca de cinco mil participantes, foi a de Bertha Celeste Homem de Mello.

Belinha tem memórias inesquecíveis de muitos de seus aniversários, na forma como evoluiu este tipo de festa ao longo das décadas de sua vida. Nos primeiros anos gostava dos aniversários pela festa e pelos presentes. Depois pela convivência, pelos presentes e pela festa. Mais tarde, preferia a festa e os presentes, depois apenas os presentes e hoje fez aniversário na cama do hospital (está internada) comemorando com um pequeno bolo individual, com uma velinha maior nele espetada, e uma enfermeira, eu e dois parentes cantando “parabéns pra você”... Nenhum dos outros seus amigos convidados foi ao hospital comemorar o seu aniversário. Lembrou-se então de um dia em que viu uma amiga (surdamente não se suportavam) enfiar o dedo “fura-bolos” no seu bolo de aniversário pensando que ninguém estava vendo. Evidentemente essa amiga nunca ficou sabendo que “aquele” pedaço do bolo que ganhara de Belinha no aniversário de 1958, levara uma dedada do “pai de todos” que previamente ela passara em sua bunda.

Em 1973 diziam que havia uma crise de petróleo, e os presentes foram uma desgraça de tão fracos e ruins. O problema é que belinha em 1972 já tinha dado presentes caros e bons a seus amigos, e voltaria a fazê-lo em 1974, depois de passada a crise. Quando chegou a moda de convidar para aniversário em casa de festas, cada convidado pagando o seu consumo, Belinha aderiu, mas a assistência ficou selecionada entre os que arranjaram uma boa desculpa para não ir, e os que não tinham como se desculpar. Foi assim durante alguns anos. Belinha jura que em algum dia da próxima década, as festas de aniversário estarão fadadas a ser comemoradas por raras famílias apenas para as crianças. Muitas aniversariantes se encheram de tantos panos de prato, outros de tantos frascos de Bozzano com dois enes. Um fenômeno que fez muitos homens detestarem loção para barba porque se viram obrigados a suportar o mesmo cheiro anos a fio porque era isso que recebiam em todos os dias 24 de dezembro e nos dias de seus aniversários, não importa de que ano.

Belinha prevê também o fim das festas de Natal, porque muitos já acham que pagam uma parcela muito alta, na divisão das despesas, para festa tão “pobre”. Festas de Natal percorreram o mesmo caminho das festas de aniversário, quase sempre passado na casa do Patriarca. Embora atualmente se passe também na casa das Matriarcas – quando se comemora – os presentes são sempre questionáveis, achando uns que deram muito e outros que receberam pouco. Peru passa voando muitas vezes cheirando a chester apressado, e o resto é decoração com muitas frutas. Muitos já não acreditam em Jesus ou têm muitas dúvidas sobre religião, família e amizades. Outros questionam que não há bebidas alcoólicas e uma grande parte virou vegetariana. Todos dizem que largaram o cigarro mas fumam lá fora ou saem apressados para satisfazer o vício que agora tem que viver escondido por ter sido escorraçado dos hábitos sociais. 

A maioria está ocupada na Internet, filhos jogando videogames, maridos e mulheres ora com dor de cabeça ora com sono. A solidão é a grande onda do século XXI. Melhor do que passar por cenas como aquela de 2001, quando a família toda quase saiu na tapa porque as comadres se zangaram e as verdades se descobriram, mas nem assim sobrou comida na mesa... Natal igual àquele, nunca mais.

Rui Rodrigues   

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